<$BlogRSDUrl$>

sexta-feira, março 24, 2006

Problemas de linguagem 

Recebi um correio electrónico a convidar-me para assistir a uma conferência, proferida por gente respeitável e credível, sobre a questäo da Procriaçäo Medicamente Assistida. O convite dizia assim:

Portugal não sabe, mas está em discussão na Assembleia da República uma lei que vai permitir situações como:
- Barrigas de aluguer;
- Gerar bébés através de sémen e/ou óvulo de um homem e mulher que não vão ser os seus pais legítimos;
- Inseminação artificial de mulheres sózinhas que vão dar à luz bébés que podem ser destinados a pares homossexuais;
- Reprodução post mortem: com recurso a sémen retirado a cadáveres;
- criação de embriões humanos excedentários cujo destino é a congelação, a investigação científica que leva à sua destruição ou simplesmente o caixote do lixo;
e a vasta lista continua...

Venha-se informar.
É urgente exigir um Referendo sobre a PMA.
* * *
Quem escreveu o texto deste convite tem, certamente, as melhores intençöes. Mas ainda näo percebeu que esta linguagem alarmista, pouco precisa e ligeiramente histérica tem um efeito contrário ao desejado. Pelo menos no que se refere a pessoas como eu, causa de imediato desconforto e desconfiança. Meio caminho andado para näo ir à conferência e sentir aversäo à causa. Apesar dos conferencistas me merecerem respeito e interesse e de o tema ser de incontestável actualidade.

Comments:
Olá 2 Manel.

Bem, eu não sei se em eco do teu post “Rir é o melhor remédio”, mas fui tomado pelo conforto e (des)confiança da ironia… É que essa da reprodução post mortem é… deliciosa ;););)

E a abertura do “Portugal não sabe” é ligeiramente derrapante. Os remetentes não são de Portugal, ou são a excepção iluminada?...

Dito isto, confesso (salvo seja:) que, embora me pareça que a relação entre metafísica e biologia é muito fecunda, não percebo grande coisa deste assunto em termos de biologia. Mas faz-me um pouco confusão esta coisa de querer imprimir-se ao todo social e cultural, as linhas de força duma parte desse todo, neste caso a cristã, e ainda por cima linhas de força que não são unânimes na comunidade cristã. Quero dizer, pelo menos devia assumir-se esta vontade de poder e não disfarçá-la com uma universalidade ética ou jurídica ou até religiosa. O D. José Policarpo, com a sua disparatada “antropologia fundamental” é que tem a mania destas coisas…

Este é o reverso duma das minhas causas de estimação – a naturalização do cristianismo… Como lá no post da cruz, aqui, por movimento contrário, trata-se da mesma falácia. Pode-se usar as categorias cristãs para indicar categorias naturais; ou então, pegar nas categorias cristãs e afirmá-las como naturais, antropológicas. A primeira dissolve o cristianismo em espiritualidade indefinida; a segunda anula a liberdade criativa específica do cristianismo, tornando-o uma obrigação natural, cultural, social. Além disso é desonesta, quero dizer, pelo menos no caso do Policarpo. Ele sabe tão bem como qualquer académico da sua área, que nem a noção de família “tradicional” é universal…

Abraços2 e bom fim de semana2.
 
Olá Vitor,
Os remetentes säo portugueses e, portanto, a "excepçäo iluminada"...
O que me chateia neste como noutros casos parecidos, nem é o "fundo da coisa". Neste caso, os conferencistas convidados säo pessoas de grande credibilidade científica que, qualquer que seja a nossa opiniäo prévia nestas matérias, vale a pena escutar.
Mas o facto de os organizadores adoptarem este "tom de cruzada", mesmo se involuntário, deita por terra qualquer interesse sério e imparcial sobre uma matéria que é eminentemente científica e técnica, apesar de toda a avaliaçäo ética subjacente, porque somos imediatamente levados a tomar uma "posiçäo moral" prévia à conferência... OU seja, fazem-nos duvidar da competência científica dos oradores, atendendo a que fica desde logo claro que a PMA é má, má, má como as cobras e, portanto, os conferencistas só säo chamados para virem dizer o que está mais que definido... (O que neste caso eu até sei que näo é verdade....).
 
Tenho lido e visto este tipo de intervenções. Abundam filósofos e médicos "católicos" sensíveis apenas às instruções do Vaticano. Às vezes é confrangedor ver até que ponto as pessoas retorcem os seus raciocínios apenas para chegarem às posições oficiais do Vaticano. E não se pense que os conhecimentos técnicos destas pessoas são assim tão profundos: muitas vezes chegam apenas onde lhes convém para justificarem o que querem.

Faltam os médicos que trabalham nesta área e, sobretudo, os casais que precisam dos tratamentos. Nestas áreas, que são novas, seria indispensável a reflexão de quem viveu as decisões éticas por dentro.
 
Entendo a tua indignação pois eu sinto exactamente o mesmo. É muito fácil o método "Maria vai com as outras", sobretudo quando se trata de temas sérios. Sem reflexão, sem pensamento, sem debate,... Alguém grita "Aqui del Rei" e pronto, todos ao molho a assinar coisas que nem sequer são lidas. Enfim!...
Abraço
 
Eu por acaso, ao contrário de ti, tenho muitas, mas muitas dúvidas, sobre " as melhores das intenções..."
 
Enviar um comentário

This page is powered by Blogger. Isn't yours?