quarta-feira, maio 03, 2006
Espiritualidade sem Deus
Há já alguns dias, o Adro recebeu uma discussäo muito interessante sobre ateísmo e cultura cristä. O ponto de partida foi uma "posta" sobre a profundidade intelectual de muitos ateus sobre temas religiosos.
Volto ao tema, mas de outra perspectiva. Podemos falar de uma "espiritualidade" ateia? Em que acredita quem näo acredita? Onde se colocam os fundamentos de uma ética sem Deus?
Estas säo apenas questöes soltas que deixo à mercê dos comentários de quem por aqui passar.
Sobre este assunto deixo também um texto de Marcel Légault que pode ajudar a centrar a reflexäo.
Volto ao tema, mas de outra perspectiva. Podemos falar de uma "espiritualidade" ateia? Em que acredita quem näo acredita? Onde se colocam os fundamentos de uma ética sem Deus?
Estas säo apenas questöes soltas que deixo à mercê dos comentários de quem por aqui passar.
Sobre este assunto deixo também um texto de Marcel Légault que pode ajudar a centrar a reflexäo.
* * *
"Un phénomène nouveau à notre époque paraît de grande importance pour penser l'avenir : aujourd'hui, il y a des hommes qui, avec vigueur, s'affirment athées bien qu'ils aient une vie spirituelle incontestable. Ils ne sont pas athées banalement, par superficialité, par entraînement. Ils se disent athées en toute conscience et, en même temps, ils ont, grâce à leur sens profond de l'humain, une vie spirituelle qui se développe d'une manière souvent plus authentique - ne faut-il pas le reconnaître ? - que la vie intérieure de nombre de chrétiens qui n'ont que des croyances sur Dieu, auxquelles ils n'ont d'ailleurs jamais réfléchi avec attention.
N'est-ce-pas là un exemple frappant - et qui donne à réfléchir - du handicap qui pèse sur le développement de la vie spirituelle d'un chrétien de souche ou de formation seulement doctrinale, porté à souscrire, sans les critiquer, à toutes les évidences qu'il a spontanément sur Dieu et qui ont été fréquemment utilisées sans discrétion par l'enseignement autoritaire qu'il a reçu ? Parfois n'en arrive-t-il pas même jusqu'à refuser comme une tentation la pensée de se poser question au sujet de l'existence de Dieu ?".
Comments:
Para ajudar à reflexão, sugiro um conjunto de crónicas que Bento Domingues redigiu em 2004, intituladas "Uma pastoral da incredulidade". Incómodas de ler, mas muito saudáveis... Podem ser consultadas na página do próprio.
JS
JS
Pois é, em que crÊ quem não crê?
Eu acho que eles crêem neles próprios, no seu poder e nas sua forças, na ciência e na medicina...
MAs a questão é que ao fazerem isto já estão a crer, o que eles não conseguem ver é que deviam crer em algo mais elevado, mais perfeito, mais maravilhoso, em Deus.
Para as pessoas, é complicado aceitarem algo que não vêm, e que mitas vezes dizem não acreditar sem terem experimentado sentir...
ABC
Eu acho que eles crêem neles próprios, no seu poder e nas sua forças, na ciência e na medicina...
MAs a questão é que ao fazerem isto já estão a crer, o que eles não conseguem ver é que deviam crer em algo mais elevado, mais perfeito, mais maravilhoso, em Deus.
Para as pessoas, é complicado aceitarem algo que não vêm, e que mitas vezes dizem não acreditar sem terem experimentado sentir...
ABC
Quem, durante a sua vida, não se rende por segundos que seja, à magnimidade do Divino? Será que, alguém, é verdadeiramente descrente? Nem que, por um momento, tenha perguntado "porque morreste?", esta pergunta é feita a quem? Não revela que há coisas que não são controladas pela ciência, pela medicina? Não revelará que todos nós temos o incómodo de ter de, um dia, nos render ao mistério? A morte é reveladora da é do homem? QUero dizer algo mais sobre isto, ams agora deixo só isto.
É muito interessante o seu comentário, sobre espiritualidade ateísta. Ajudados com a reflexão de Marcel teremos mais sentido, no viver e professar a fé. Já, agora, partilho o meu blog disponivel em http://vm11.blogspot.com/
Padre Vítor Magalhães,
Diocese de Bragança-Miranda
Padre Vítor Magalhães,
Diocese de Bragança-Miranda
Bom, sobre o assunto não tenho as matérias mentalmente organizadas - nunca dei uma aula sobre isto, nunca escrevi um texto, ... e não tenho tempo para organizá-las. Vai em notas soltas.
1) Filho de judeu cultural, religiosamente indiferente, e de católica sociológica, igualmente religiosamente indiferente, ninguém me deu religião com as papas. Religião era assunto de que se podia falar, claro, mas para quê? Tirando amigos ( judeus ) do meu pai e primos ( padres ) da minha mãe, ninguém achava que fosse assunto que valesse uma conversa.
2) Pode parecer absurdo, mas muito cedo, dez?, senti que para que a vida tivesse um sentido era precisa alguma coisa mais que o que tinha à mão, e que nas religiões se tratava dessa coisa. Li a Bíblia aos treze, de enfiada; fiquei enfadado com o Velho Testamento ( com excepções ); fiquei maravilhado com os quatro Evangelhos; sentimentos mistos nos outros textos do Novo Testamento.
3) Há uma diferença óbvia entre os Evangelhos e o resto. No resto, encontra-se de tudo: há frequentemente coisas que, por ser homem, só por ser homem, tenho o dever de rejeitar. Nos Evangelhos, não encontro nada a que a minha consciência me impeça de aderir. Há pontos racionalmente "absurdos" - divindade de Jesus, ressureição de Jesus, vida eterna. Mas não contrariam a minha consciência moral.
4) Com o tempo, fui tentando estudar diversas respostas religiosas e "passei" por diversas religiões organizadas ( cristãos reformados, judaísmo ). Saí sempre por encontrar alguma coisa que não podia aceitar. Assim, a salvação pela fé só, que acabei por considerar um disparate redondo, fez-me abandonar os reformados; assim, a centralidade de Jesus, que ao longo dos anos foi-se impondo como certa, fez-me abandonar o judaísmo.
5) Aos trinta, mandei às urtigas a procura de uma religião pré-formatada que me servisse e decidi construir a minha: ficaria para sempre em paz com a minha consciência, nunca teria que andar a lutar comigo próprio sobre posições alheias que me repugnavam.
6) O resultado? Ora, 'inda não acabou a história, 'inda procuro. Mas há conclusões provisórias.
7) Deus existe - mas tenho sentimentos ( não são "ideias" )muito vagos sobre o que seja. Porém, tenho certezas absolutas sobre o que não é - o que inclui a maior parte das coisas que as igrejas dizem que é.
8) Nas férias da Páscoa, apanhei a maior molha da minha vida ao subir a ( e descer de ) a serra da Nogueira: sete horinhas de chuvada. Ocasião ideal para reflectir na Criação. Admitamos que Deus criou o mundo ( mesmo com Deus, há outras possibilidades ). Porquê? Resposta possível: queria dar-se a conhecer. Outra resposta possível: sentia-se sozinho e precisava de companhia. A primeira será considerada aceitável, porque "querer" é uma nobre função humana. A segunda será um disparate, porque "sentir-se sozinho" é próprio de homens fracos ( ou mulheres ou paneleiros ), e porque Deus é incontingente, logo não pode "precisar de". E, contudo, a segunda resposta é a que me fala: mostra claramente a Criação como acto de amor, nos dois sentidos. Eu estou muito interessado num Deus que está sozinho e precisa de mim. Mas não tenho nada a ver com o Deus tradicional, projeção para cima dos manda-chuva terrestres.
9) Como esta, há muitas, muitas outras, em que um tipo se apercebe que sob o nome "Deus" o homem se limitou a pôr o poder e a força. Isso não me interessa. O meu Deus está próximo de mim, não afastado; é outro, mas não há qualquer sentimento de alteridade; e está ligado às minhas fraquezas, não às minhas forças. Nem preciso de Jesus para isto. É claro que não é o Deus usual - por isto me digo ateu, para evitar confusões, para que não pensem que tenho alguma coisa a ver com essa personagem todo-poderosa, etc, que os judeus inventaram e legaram à humanidade.
10) Jesus é um caso especial. Lendo os Evangelhos, treme-se. E não é de medo. Amar irrestrictamente, amar quem nos não ama, amar os nossos inimigos - é uma loucura completa e escandalosa. Quanto mais penso, mais claro é que é o único caminho possivel.
11) É extraordinário como, vivendo quando viveu, na sociedade em que viveu, com os seicentos e tal preceitos negativos da lei moisaica, aquele homem lhe deu a volta da maneira que deu! Não encontro uma só exclusão nas palavras dele! ( Há algumas, de natureza nacional-religiosa, mas são corrigidas depois. ) Todas as proibições miudinhas, todos os estigmas, todas as discriminações e exclusões, tudo isso voa em pedaços - para ficar só o amor irrestricto do outro.
12) Claro, poucos anos depois já se voltava atrás, já Paulo e outros re-alinhavam as velhas exclusões ( entre elas - o que me diz respeito, porque sou paneleiro - a homossexualidade ). Daí para cá, tem sido um ver-se-te-avias e, sinceramente, nem em discutir a questão estou interessado.
13) Ressureição, vida eterna. Para mim, é uma curiosidade. Nunca senti essa questão como importante. Outro dia, ao levar as compras para o carro, uma criança fraquinha, tão suja que nem dava para saber se menino, se menina, veio ter comigo e pediu-me leite. Arranjei um saco e fui pondo pacotes; cheio, pediu mais; outro saco cheio; chegado a doze pacotes, os que tinha comprado, perguntei-lhe se queria que o levasse a casa. Pânico e fugiu a correr com os sacos ( como, meu Deus, como? ). Adivinhamos o passado, o presente e o futuro dele. Se alguém precisa de ressureição é ele. Eu já tive uma boa vida. Se há lotação limitada e - por engano, certamente por engano - eu tiver bilhete, cedo-lho sem problemas. Como eu, ( quase ) todos os que crêem apaixonadamente na Ressureição. Porque é só no Outro que conseguimos ver Deus e é só na direcção horizontal do amor que conseguimos materializar a vertical. I rest my case.
14) A justificação pela fé. Fé não traduzida em obras não é fé. A fé interessa porque dá força para as obras; em si mesma, não é valor. A poesia de Paulo/Racine que puseste, quando afirma que no fim ficará so o amor, até pode ser entendida assim - e não no sentido escatológico usual. ( O Paulo, se ouvisse isto, ficava fulo.)
15) A doutrina. Inclui das maiores aberrações que a mente humana já produziu. A contaminação da mensagem de Jesus pela filosofia grega, dando pasto a milhares e milhares de teólogos pelos séculos fora - foi do pior que podia ter sucedido. Quando todas as suma, todos os tratados, todos os catecismos tiverem desaparecido ( e quanto mais cedo melhor - já sabes que os considero empecilhos ), os Evangelhos só darão com vantagem conta do recado.
16) No fundo, embora me esteja absolutamente nas tintas para questões doutrinais, embora a definição de uma ortodoxia, uma crença correcta, não me diga nada, não lhe sou de todo oposto. Desde que com humildade, muita humildadezinha, sempre sem a pretensão de ter descoberto e, sobretudo, de querer impor. Não é a doutrina que me impede de ser membro da tua igreja - embora haja nela pontos que nem com molho de manteiga. Mas é que é-me mesmo indiferente... O busílis é a ortopraxia ... que não existe.
17) Não posso ser membro de uma igreja estruturada de modo autoritário; que discrimina os membros por género e orientação sexual; que tem uma moral sexual delirante; que recorreu por sistema a César para impor as suas "propostas" ( e que hoje só não o faz porque César lhe cortou as vasas - não é porque ela não queira ); que, devendo dar exemplo de pobreza, gosta de acumular riquezas; e por aí fora.
Enfim, não tenho mesmo mais tempo e isto vai muito descosido. Mas é o que posso.
Vale,
ZR.
1) Filho de judeu cultural, religiosamente indiferente, e de católica sociológica, igualmente religiosamente indiferente, ninguém me deu religião com as papas. Religião era assunto de que se podia falar, claro, mas para quê? Tirando amigos ( judeus ) do meu pai e primos ( padres ) da minha mãe, ninguém achava que fosse assunto que valesse uma conversa.
2) Pode parecer absurdo, mas muito cedo, dez?, senti que para que a vida tivesse um sentido era precisa alguma coisa mais que o que tinha à mão, e que nas religiões se tratava dessa coisa. Li a Bíblia aos treze, de enfiada; fiquei enfadado com o Velho Testamento ( com excepções ); fiquei maravilhado com os quatro Evangelhos; sentimentos mistos nos outros textos do Novo Testamento.
3) Há uma diferença óbvia entre os Evangelhos e o resto. No resto, encontra-se de tudo: há frequentemente coisas que, por ser homem, só por ser homem, tenho o dever de rejeitar. Nos Evangelhos, não encontro nada a que a minha consciência me impeça de aderir. Há pontos racionalmente "absurdos" - divindade de Jesus, ressureição de Jesus, vida eterna. Mas não contrariam a minha consciência moral.
4) Com o tempo, fui tentando estudar diversas respostas religiosas e "passei" por diversas religiões organizadas ( cristãos reformados, judaísmo ). Saí sempre por encontrar alguma coisa que não podia aceitar. Assim, a salvação pela fé só, que acabei por considerar um disparate redondo, fez-me abandonar os reformados; assim, a centralidade de Jesus, que ao longo dos anos foi-se impondo como certa, fez-me abandonar o judaísmo.
5) Aos trinta, mandei às urtigas a procura de uma religião pré-formatada que me servisse e decidi construir a minha: ficaria para sempre em paz com a minha consciência, nunca teria que andar a lutar comigo próprio sobre posições alheias que me repugnavam.
6) O resultado? Ora, 'inda não acabou a história, 'inda procuro. Mas há conclusões provisórias.
7) Deus existe - mas tenho sentimentos ( não são "ideias" )muito vagos sobre o que seja. Porém, tenho certezas absolutas sobre o que não é - o que inclui a maior parte das coisas que as igrejas dizem que é.
8) Nas férias da Páscoa, apanhei a maior molha da minha vida ao subir a ( e descer de ) a serra da Nogueira: sete horinhas de chuvada. Ocasião ideal para reflectir na Criação. Admitamos que Deus criou o mundo ( mesmo com Deus, há outras possibilidades ). Porquê? Resposta possível: queria dar-se a conhecer. Outra resposta possível: sentia-se sozinho e precisava de companhia. A primeira será considerada aceitável, porque "querer" é uma nobre função humana. A segunda será um disparate, porque "sentir-se sozinho" é próprio de homens fracos ( ou mulheres ou paneleiros ), e porque Deus é incontingente, logo não pode "precisar de". E, contudo, a segunda resposta é a que me fala: mostra claramente a Criação como acto de amor, nos dois sentidos. Eu estou muito interessado num Deus que está sozinho e precisa de mim. Mas não tenho nada a ver com o Deus tradicional, projeção para cima dos manda-chuva terrestres.
9) Como esta, há muitas, muitas outras, em que um tipo se apercebe que sob o nome "Deus" o homem se limitou a pôr o poder e a força. Isso não me interessa. O meu Deus está próximo de mim, não afastado; é outro, mas não há qualquer sentimento de alteridade; e está ligado às minhas fraquezas, não às minhas forças. Nem preciso de Jesus para isto. É claro que não é o Deus usual - por isto me digo ateu, para evitar confusões, para que não pensem que tenho alguma coisa a ver com essa personagem todo-poderosa, etc, que os judeus inventaram e legaram à humanidade.
10) Jesus é um caso especial. Lendo os Evangelhos, treme-se. E não é de medo. Amar irrestrictamente, amar quem nos não ama, amar os nossos inimigos - é uma loucura completa e escandalosa. Quanto mais penso, mais claro é que é o único caminho possivel.
11) É extraordinário como, vivendo quando viveu, na sociedade em que viveu, com os seicentos e tal preceitos negativos da lei moisaica, aquele homem lhe deu a volta da maneira que deu! Não encontro uma só exclusão nas palavras dele! ( Há algumas, de natureza nacional-religiosa, mas são corrigidas depois. ) Todas as proibições miudinhas, todos os estigmas, todas as discriminações e exclusões, tudo isso voa em pedaços - para ficar só o amor irrestricto do outro.
12) Claro, poucos anos depois já se voltava atrás, já Paulo e outros re-alinhavam as velhas exclusões ( entre elas - o que me diz respeito, porque sou paneleiro - a homossexualidade ). Daí para cá, tem sido um ver-se-te-avias e, sinceramente, nem em discutir a questão estou interessado.
13) Ressureição, vida eterna. Para mim, é uma curiosidade. Nunca senti essa questão como importante. Outro dia, ao levar as compras para o carro, uma criança fraquinha, tão suja que nem dava para saber se menino, se menina, veio ter comigo e pediu-me leite. Arranjei um saco e fui pondo pacotes; cheio, pediu mais; outro saco cheio; chegado a doze pacotes, os que tinha comprado, perguntei-lhe se queria que o levasse a casa. Pânico e fugiu a correr com os sacos ( como, meu Deus, como? ). Adivinhamos o passado, o presente e o futuro dele. Se alguém precisa de ressureição é ele. Eu já tive uma boa vida. Se há lotação limitada e - por engano, certamente por engano - eu tiver bilhete, cedo-lho sem problemas. Como eu, ( quase ) todos os que crêem apaixonadamente na Ressureição. Porque é só no Outro que conseguimos ver Deus e é só na direcção horizontal do amor que conseguimos materializar a vertical. I rest my case.
14) A justificação pela fé. Fé não traduzida em obras não é fé. A fé interessa porque dá força para as obras; em si mesma, não é valor. A poesia de Paulo/Racine que puseste, quando afirma que no fim ficará so o amor, até pode ser entendida assim - e não no sentido escatológico usual. ( O Paulo, se ouvisse isto, ficava fulo.)
15) A doutrina. Inclui das maiores aberrações que a mente humana já produziu. A contaminação da mensagem de Jesus pela filosofia grega, dando pasto a milhares e milhares de teólogos pelos séculos fora - foi do pior que podia ter sucedido. Quando todas as suma, todos os tratados, todos os catecismos tiverem desaparecido ( e quanto mais cedo melhor - já sabes que os considero empecilhos ), os Evangelhos só darão com vantagem conta do recado.
16) No fundo, embora me esteja absolutamente nas tintas para questões doutrinais, embora a definição de uma ortodoxia, uma crença correcta, não me diga nada, não lhe sou de todo oposto. Desde que com humildade, muita humildadezinha, sempre sem a pretensão de ter descoberto e, sobretudo, de querer impor. Não é a doutrina que me impede de ser membro da tua igreja - embora haja nela pontos que nem com molho de manteiga. Mas é que é-me mesmo indiferente... O busílis é a ortopraxia ... que não existe.
17) Não posso ser membro de uma igreja estruturada de modo autoritário; que discrimina os membros por género e orientação sexual; que tem uma moral sexual delirante; que recorreu por sistema a César para impor as suas "propostas" ( e que hoje só não o faz porque César lhe cortou as vasas - não é porque ela não queira ); que, devendo dar exemplo de pobreza, gosta de acumular riquezas; e por aí fora.
Enfim, não tenho mesmo mais tempo e isto vai muito descosido. Mas é o que posso.
Vale,
ZR.
Zé,
Acabei de ler as tuas notas soltas.
O teu texto surpreendeu-me pela positiva.
Dizes coisas bonitas, coisas importantes, coisas certas e outras que näo posso subscrever.
Comento apenas algumas:
1. "mandei às urtigas a procura de uma religião pré-formatada que me servisse e decidi construir a minha". "(...)não tenho nada a ver com o Deus tradicional, projeção para cima dos manda-chuva terrestres".
Percebo o que queres dizer. Mas esse caminho da procura de uma religiäo à própria medida pode ser o caminho mais rápido para acabar por construír mais uma "projecçäo humana", que referes. Arriscas-te a ter um Deus construído por ti, em vez de um Deus descoberto por ti. E, se for assim, será um Deus sem salvaçäo.
Acreditar em Deus é mais conformar-me a Ele do que conformá-l'O a mim.
2. "Eu estou muito interessado num Deus que está sozinho e precisa de mim(...)
O meu Deus está próximo de mim, não afastado; é outro, mas não há qualquer sentimento de alteridade; e está ligado às minhas fraquezas, não às minhas forças".
A fé brota sempre de uma experiência pessoal; de um encontro/descoberta. É uma relaçäo pessoal. Mas uma relaçäo generosa: eu näo entro numa relaçäo apenas porque sei que a outra pessoa se "ajeita" às minhas necessidades; entro porque a descoberta dessa pessoa me faz querer dar alguma coisa de mim; mudar alguma coisa na minha vida...
3. "É claro que não é o Deus usual - por isto me digo ateu, para evitar confusões, para que não pensem que tenho alguma coisa a ver com essa personagem todo-poderosa, etc, que os judeus inventaram e legaram à humanidade"
Supondo o que ficou dito no ponto 2, resta-me dizer que de tudo o que os "outros" (mete aí judeus, tradiçäo, doutrina, teólogos, etc...) dizem, nem tudo é "feio, porco e mau". Há uma experiência de Deus, uma vivência individual, familiar, comunitária de Deus que näo só é positiva, como é, ela própria, manifestaçäo do amor de Deus e da experiência de Deus. Náo se pode deitar o bébé fora com a água do banho... :)
Uma nota final: Marcel Légault refere o "sentido do humano" como fundamento da tal espiritualidade ateia. Parece-me que é o que dizes quando afirmas:"Porque é só no Outro que conseguimos ver Deus e é só na direcção horizontal do amor que conseguimos materializar a vertical". Porque se näo for isso... é porque já näo és ateu...:)
Abraço
Acabei de ler as tuas notas soltas.
O teu texto surpreendeu-me pela positiva.
Dizes coisas bonitas, coisas importantes, coisas certas e outras que näo posso subscrever.
Comento apenas algumas:
1. "mandei às urtigas a procura de uma religião pré-formatada que me servisse e decidi construir a minha". "(...)não tenho nada a ver com o Deus tradicional, projeção para cima dos manda-chuva terrestres".
Percebo o que queres dizer. Mas esse caminho da procura de uma religiäo à própria medida pode ser o caminho mais rápido para acabar por construír mais uma "projecçäo humana", que referes. Arriscas-te a ter um Deus construído por ti, em vez de um Deus descoberto por ti. E, se for assim, será um Deus sem salvaçäo.
Acreditar em Deus é mais conformar-me a Ele do que conformá-l'O a mim.
2. "Eu estou muito interessado num Deus que está sozinho e precisa de mim(...)
O meu Deus está próximo de mim, não afastado; é outro, mas não há qualquer sentimento de alteridade; e está ligado às minhas fraquezas, não às minhas forças".
A fé brota sempre de uma experiência pessoal; de um encontro/descoberta. É uma relaçäo pessoal. Mas uma relaçäo generosa: eu näo entro numa relaçäo apenas porque sei que a outra pessoa se "ajeita" às minhas necessidades; entro porque a descoberta dessa pessoa me faz querer dar alguma coisa de mim; mudar alguma coisa na minha vida...
3. "É claro que não é o Deus usual - por isto me digo ateu, para evitar confusões, para que não pensem que tenho alguma coisa a ver com essa personagem todo-poderosa, etc, que os judeus inventaram e legaram à humanidade"
Supondo o que ficou dito no ponto 2, resta-me dizer que de tudo o que os "outros" (mete aí judeus, tradiçäo, doutrina, teólogos, etc...) dizem, nem tudo é "feio, porco e mau". Há uma experiência de Deus, uma vivência individual, familiar, comunitária de Deus que näo só é positiva, como é, ela própria, manifestaçäo do amor de Deus e da experiência de Deus. Náo se pode deitar o bébé fora com a água do banho... :)
Uma nota final: Marcel Légault refere o "sentido do humano" como fundamento da tal espiritualidade ateia. Parece-me que é o que dizes quando afirmas:"Porque é só no Outro que conseguimos ver Deus e é só na direcção horizontal do amor que conseguimos materializar a vertical". Porque se näo for isso... é porque já näo és ateu...:)
Abraço
Caro Manuel:
O teu ponto 1)
Claro que corro esse risco e já pensei muitas vezes nisso.
Procuro minorar o risco "conversando" com outras pessoas, ainda vivas ou já mortas, com caminho análogo ao meu ou diferente; e aprendendo com elas.
Mas pondera o outro termo da alternativa, a adesão a uma pré-formatada, por exemplo a tua: gerações de doutas e piedosas pessoas deveriam garantir que não houvesse a subjectividade que arrisco; e contudo tanta asneira e tanto disparate! Poderei errar - mas não excluirei ninguém.
Quanto à salvação: já percebeste, o meu ponto 13, que não é para mim assunto importante. E não concordo contigo que por construir o "meu" Deus - em vez de descobrir o Deus "objectivo" - a salvação esteja ipso facto arredada. Mas repito ( e espanto-me como esta afirmação costuma espantar as pessoas! ): não é para mim assunto importante, tão-só uma curiosidade.
O teu ponto 2)
Claro, tudo o que dizes está certo; mas não vejo a adequação ao que extraíste dos meus comentários. É precisamente porque quero dar alguma coisa de mim que me interesso por um Deus que precisa dos homens.
O teu ponto 3)
Claro que nem tudo o que referes é feio, porco e mau - muito longe disso!! Ando a ler a "Imitação de Cristo", à partida bem afastada de mim, e é belíssima! E se vou a Santiago à pata não é só por razões "culturais". E não é só por curiosidade microsociológica que procuro passar um tempito numa casa de Cister em França.
A tua nota final)
Não, não é só isso; é claro que não sou ateu. Mas, como expliquei, não gosto de confusões. E a palavra "Deus" e o conceito associado têm sido tão preversamente usados pelos homens, que um pouco de "retenue" na matéria só pode ser salutar. Fazia muito bem "Deus" ir de férias por uma gerações de homens.
Um abraço,
ZR.
O teu ponto 1)
Claro que corro esse risco e já pensei muitas vezes nisso.
Procuro minorar o risco "conversando" com outras pessoas, ainda vivas ou já mortas, com caminho análogo ao meu ou diferente; e aprendendo com elas.
Mas pondera o outro termo da alternativa, a adesão a uma pré-formatada, por exemplo a tua: gerações de doutas e piedosas pessoas deveriam garantir que não houvesse a subjectividade que arrisco; e contudo tanta asneira e tanto disparate! Poderei errar - mas não excluirei ninguém.
Quanto à salvação: já percebeste, o meu ponto 13, que não é para mim assunto importante. E não concordo contigo que por construir o "meu" Deus - em vez de descobrir o Deus "objectivo" - a salvação esteja ipso facto arredada. Mas repito ( e espanto-me como esta afirmação costuma espantar as pessoas! ): não é para mim assunto importante, tão-só uma curiosidade.
O teu ponto 2)
Claro, tudo o que dizes está certo; mas não vejo a adequação ao que extraíste dos meus comentários. É precisamente porque quero dar alguma coisa de mim que me interesso por um Deus que precisa dos homens.
O teu ponto 3)
Claro que nem tudo o que referes é feio, porco e mau - muito longe disso!! Ando a ler a "Imitação de Cristo", à partida bem afastada de mim, e é belíssima! E se vou a Santiago à pata não é só por razões "culturais". E não é só por curiosidade microsociológica que procuro passar um tempito numa casa de Cister em França.
A tua nota final)
Não, não é só isso; é claro que não sou ateu. Mas, como expliquei, não gosto de confusões. E a palavra "Deus" e o conceito associado têm sido tão preversamente usados pelos homens, que um pouco de "retenue" na matéria só pode ser salutar. Fazia muito bem "Deus" ir de férias por uma gerações de homens.
Um abraço,
ZR.
Muito mal estaría o nosso mundo se só os cristãos tivessem "vida espiritual", ou espiritualidade.
Nem queiramos ser donos da espiritualidade. Seríamos os maisores "asnos" deste mundo. Acreditar em deus é uma coisa (os "espíritos impuros" também acreditavam - sic Evangelho); viver em conformidade com essa fé, "crença" é outra coisa (os atráz citados não o faziam); Viver espiritualmente é outra ainda...
Um abraço
Nem queiramos ser donos da espiritualidade. Seríamos os maisores "asnos" deste mundo. Acreditar em deus é uma coisa (os "espíritos impuros" também acreditavam - sic Evangelho); viver em conformidade com essa fé, "crença" é outra coisa (os atráz citados não o faziam); Viver espiritualmente é outra ainda...
Um abraço
Só mais umas coisitas antes de ir para as aulas:
1) A dimensão colectiva da religião. Claro, claro, tem que haver essa dimensão. Mas não é necessário que revista o aspecto de uma igreja formalizada.
2) Há muito mais gente que segue caminhos próximos do meu que o que tu possas suspeitar. Se te esqueceres que és padre e falares com as pessoas sobre estes assuntos, verás que são mesmo muitas.
3) É importante que não lhes apareças como padre - senão retraem-se e fecham-se. E não quero dizer só o aspecto exterior. Estou a falar dos automatismos que te ensinaram; ouvi-los e pensar logo em sincretismo, subjectivismo, laicismo, -ismo, -ismo. Em suma, tens que abandonar a atitude "vamos-lá-levar-a-luz-aos-ceguetas", fazer uma mudança de referencial, e pores-te verdadeiramente no lugar do interlocutor. Verás a quantidade de gente que há!
4) Ainda estas férias conheci mais dois: um puto de 22 anos e minha prima Ana Maria, com 55 como eu.
5) O puto ( pai católico, mãe testemunha de Jeová ) foi expulso de casa dos pais aos 16 por ser paneleiro. Vive, numa pequena vila alentejana, com o companheiro, há cinco anos. Não pôde continuar a estudar para além do 12º, mas ganha bem a vida como técnico de informática de nível III. Imaginarás a coragem que é preciso ter para este percurso? Prefiro-a à "coragem" que a tua igreja lhe propõe de renegar a sua sexualidade e ter vergonha de si proprio. É das pessoas mais alegres que conheço. Falando sobre o aborto - a que ambos nos opomos sem quaisquer dúvidas - as cerejas começaram a puxar as cerejas e descobrimos que pensamos quase da mesma maneira sobre Deus e Jesus.
6) Não são só coisas de paneleiros sem pedigree religioso. Minha prima é de "pure souche catholique" e hetero como se deve ser. Camponesa, com a primária. A propósito do significado do compasso pascal, pomo-nos à conversa e - tumba! - as mesmas ideias. Curiosidade: é também das pessoas mais alegres que conheço.
7) Eu não faço a mínima ideia do que é que a tua igreja deve fazer conosco - e, para ser franco, não é assunto que me tire o sono. Mas é muito provável que um dia ela tenha que pensar seriamente no assunto.
8) Uma dica: Injunções negativas, catálogos de pecados, instruções pormenorizadas sobre como proceder em todas as situações imagináveis, bref, o farisaísmo em que vocês se tornaram mestres - não nos atrai; pelo contrário, repele-nos.
Outra dica: Liberdade. Ninguém nos tirará a liberdade de decidirmos segundo a nossa consciência. Podemos ouvir os outros, podemos ouvir todos, mas decidiremos sempre segundo as nossas consciências.
Treceira dica: Segundo o JS, citando o comuna do Débray, em todas as instituições humanas a dor da exclusão reforça a doçura da inclusão. Muito obrigado, mas também não almejamos tal doçura. Que um comuna diga isso parece-nos muito natural ( sem ofensa, que tenho a maior simpatia por eles ). Mas dum cristão, não aceitamos. Temos a ilusão que Jesus veio ao mundo por alguma razão e que quem o segue não pode excluir. ( E não vale aquele velho truque de odiar o pecado e amar o pecador ).
E tenho que ir explicar à rapaziada a diagonalização de matrizes simétricas.
Um abraço muito grande,
ZR.
1) A dimensão colectiva da religião. Claro, claro, tem que haver essa dimensão. Mas não é necessário que revista o aspecto de uma igreja formalizada.
2) Há muito mais gente que segue caminhos próximos do meu que o que tu possas suspeitar. Se te esqueceres que és padre e falares com as pessoas sobre estes assuntos, verás que são mesmo muitas.
3) É importante que não lhes apareças como padre - senão retraem-se e fecham-se. E não quero dizer só o aspecto exterior. Estou a falar dos automatismos que te ensinaram; ouvi-los e pensar logo em sincretismo, subjectivismo, laicismo, -ismo, -ismo. Em suma, tens que abandonar a atitude "vamos-lá-levar-a-luz-aos-ceguetas", fazer uma mudança de referencial, e pores-te verdadeiramente no lugar do interlocutor. Verás a quantidade de gente que há!
4) Ainda estas férias conheci mais dois: um puto de 22 anos e minha prima Ana Maria, com 55 como eu.
5) O puto ( pai católico, mãe testemunha de Jeová ) foi expulso de casa dos pais aos 16 por ser paneleiro. Vive, numa pequena vila alentejana, com o companheiro, há cinco anos. Não pôde continuar a estudar para além do 12º, mas ganha bem a vida como técnico de informática de nível III. Imaginarás a coragem que é preciso ter para este percurso? Prefiro-a à "coragem" que a tua igreja lhe propõe de renegar a sua sexualidade e ter vergonha de si proprio. É das pessoas mais alegres que conheço. Falando sobre o aborto - a que ambos nos opomos sem quaisquer dúvidas - as cerejas começaram a puxar as cerejas e descobrimos que pensamos quase da mesma maneira sobre Deus e Jesus.
6) Não são só coisas de paneleiros sem pedigree religioso. Minha prima é de "pure souche catholique" e hetero como se deve ser. Camponesa, com a primária. A propósito do significado do compasso pascal, pomo-nos à conversa e - tumba! - as mesmas ideias. Curiosidade: é também das pessoas mais alegres que conheço.
7) Eu não faço a mínima ideia do que é que a tua igreja deve fazer conosco - e, para ser franco, não é assunto que me tire o sono. Mas é muito provável que um dia ela tenha que pensar seriamente no assunto.
8) Uma dica: Injunções negativas, catálogos de pecados, instruções pormenorizadas sobre como proceder em todas as situações imagináveis, bref, o farisaísmo em que vocês se tornaram mestres - não nos atrai; pelo contrário, repele-nos.
Outra dica: Liberdade. Ninguém nos tirará a liberdade de decidirmos segundo a nossa consciência. Podemos ouvir os outros, podemos ouvir todos, mas decidiremos sempre segundo as nossas consciências.
Treceira dica: Segundo o JS, citando o comuna do Débray, em todas as instituições humanas a dor da exclusão reforça a doçura da inclusão. Muito obrigado, mas também não almejamos tal doçura. Que um comuna diga isso parece-nos muito natural ( sem ofensa, que tenho a maior simpatia por eles ). Mas dum cristão, não aceitamos. Temos a ilusão que Jesus veio ao mundo por alguma razão e que quem o segue não pode excluir. ( E não vale aquele velho truque de odiar o pecado e amar o pecador ).
E tenho que ir explicar à rapaziada a diagonalização de matrizes simétricas.
Um abraço muito grande,
ZR.
Zé,
Apenas uma ou duas notas sobre o teu último comentário:
1. Tenho noçäo de que há muita gente em circunstâncias semelhantes às tuas. Conheço muitas e chegam-me ecos de muitas outras.
2. Já vi essa sensaçäo de retraimento muitas vezes, quando o facto de ser padre se torna conhecido. Depois de uma ou muitas conversas interessantíssimas, esse dado transforma imediatamente o diálogo. Mas aí eu näo posso fazer nada... Sou o que sou.
3. É verdades que esses automatismos que referes no ponto 3 existem. Mas sempre tentei resistir-lhes. Às vezes eles vêm ao de cima. Outras näo.
Sempre critiquei essa posiçäo de "Vamos lá iluminar esta gente que vive nas trevas". Essa postura é responsável por boa parte da indiferença religiosa e, também, do ateísmo militante.
4. Quanto ao que a Igreja deve fazer com "vocês"... Se calhar nada. A Igreja deve ESTAR aí, como sinal e âmbito da experiência de Deus (para o que tem de passar por muitas mudanças...) para que tu possas, quando o quiseres e se quiseres, fazer parte dela sem medo de te desiludires. Para que possas ser Ela.
5. Quanto às tuas dicas... eu próprio as poderia ter escrito... :)
6. Por último: o nosso sentido crítico näo deve cegar-nos em relaçäo ao muito de bom que existe na Igreja. Falamos de mais de mil milhöes de pessoas em todo o mundo. Há uma hierarquia e há muitos outros âmbitos, grupos, formas de viver a Comunhäo eclesial, etc...etc... Näo é tudo o mesmo. Há de tudo. e O fundamental é aquilo que lhe dá sentido...
Abraço
Apenas uma ou duas notas sobre o teu último comentário:
1. Tenho noçäo de que há muita gente em circunstâncias semelhantes às tuas. Conheço muitas e chegam-me ecos de muitas outras.
2. Já vi essa sensaçäo de retraimento muitas vezes, quando o facto de ser padre se torna conhecido. Depois de uma ou muitas conversas interessantíssimas, esse dado transforma imediatamente o diálogo. Mas aí eu näo posso fazer nada... Sou o que sou.
3. É verdades que esses automatismos que referes no ponto 3 existem. Mas sempre tentei resistir-lhes. Às vezes eles vêm ao de cima. Outras näo.
Sempre critiquei essa posiçäo de "Vamos lá iluminar esta gente que vive nas trevas". Essa postura é responsável por boa parte da indiferença religiosa e, também, do ateísmo militante.
4. Quanto ao que a Igreja deve fazer com "vocês"... Se calhar nada. A Igreja deve ESTAR aí, como sinal e âmbito da experiência de Deus (para o que tem de passar por muitas mudanças...) para que tu possas, quando o quiseres e se quiseres, fazer parte dela sem medo de te desiludires. Para que possas ser Ela.
5. Quanto às tuas dicas... eu próprio as poderia ter escrito... :)
6. Por último: o nosso sentido crítico näo deve cegar-nos em relaçäo ao muito de bom que existe na Igreja. Falamos de mais de mil milhöes de pessoas em todo o mundo. Há uma hierarquia e há muitos outros âmbitos, grupos, formas de viver a Comunhäo eclesial, etc...etc... Näo é tudo o mesmo. Há de tudo. e O fundamental é aquilo que lhe dá sentido...
Abraço
Caríssimo Manuel:
Agradeço-te as palavras do ponto 4), mas receio bem que não seja na minha vida. Às vezes, "vocês" descansam na eternidade que Jesus vos prometeu e perdem o sentido da urgência. Pode ser que no dia em que as mudanças que referes estejam feitas, os homens já estejam de costas voltadas para vós.
Quanto ao ponto 6), ... sim, é possível que tenhas razão, que a minha visão deva ser mais "globalizada". Em parte, ando a tentar fazer isso, esquecer os dislates da parte mais visível e procurar ... aquilo que, por ser mais pequenino e humilde, custa mais a ver.
Um abraço,
ZR.
Agradeço-te as palavras do ponto 4), mas receio bem que não seja na minha vida. Às vezes, "vocês" descansam na eternidade que Jesus vos prometeu e perdem o sentido da urgência. Pode ser que no dia em que as mudanças que referes estejam feitas, os homens já estejam de costas voltadas para vós.
Quanto ao ponto 6), ... sim, é possível que tenhas razão, que a minha visão deva ser mais "globalizada". Em parte, ando a tentar fazer isso, esquecer os dislates da parte mais visível e procurar ... aquilo que, por ser mais pequenino e humilde, custa mais a ver.
Um abraço,
ZR.
Caro ZR
Vejo que continuas incomodado com as minhas palavras... Por um lado, como já terás dado conta, a verdade é que sou um cristão "sui generis": as minhas ideias não são muito representativas da comunidade a que pertenço (ou digo pertencer). Por outro lado, creio perceber a razão do teu incómodo: como tu próprio dizes, tens a ilusão de que Jesus veio ao mundo para anular todas as exclusões.
Mesmo correndo o risco de estar a roubar-te os sonhos, insisto na minha cínica opinião: não há inclusão sem exclusão; não há dentro sem fora; não há "nós" sem "vocês".
A grande novidade de Jesus é lutar pela inclusão dos excluídos; mas, no reverso da medalha, há a exclusão dos exclusivistas. Um bom exemplo disso é a versão de Lucas das bem-aventuranças: aos quatro macarismos apontados, fazem-se corresponder quatro imprecações. Se os pobres são bem-aventurados, bem-vindos, incluídos, os ricos são mal-aventurados, encontram-se em situação de exclusão. Etc.
Pode-se dizer que é somente ameaça, que é apelo à conversão; ou que não se trata de excluir activamente, mas apenas de auto-exclusão; ou que no final, a misericórdia de Deus tudo superará; todavia, a questão mantém-se. De facto, o cobertor é pequeno: se se tapa a cabeça, destapam-se os pés; e se à força se quer tapar tudo, acaba-se por rompê-lo. Claro que a solução não é cortar os pés; mas também não é andar à procura de cobertores mágicos...
Faz-nos falta sonhar com os tempos messiânicos: o leão que brinca com o cordeiro, a criança que mete a mão na toca da víbora, o comunista que participa no comício do fascista, o homofóbico que dorme na mesma cama que o homossexual, Ratzinger e Boff a rezarem juntos... Mas também nos cabe compreeender, sem fáceis moralismos, porque é que a realidade tantas vezes contradiz os nossos ideais e bons propósitos.
JS
Vejo que continuas incomodado com as minhas palavras... Por um lado, como já terás dado conta, a verdade é que sou um cristão "sui generis": as minhas ideias não são muito representativas da comunidade a que pertenço (ou digo pertencer). Por outro lado, creio perceber a razão do teu incómodo: como tu próprio dizes, tens a ilusão de que Jesus veio ao mundo para anular todas as exclusões.
Mesmo correndo o risco de estar a roubar-te os sonhos, insisto na minha cínica opinião: não há inclusão sem exclusão; não há dentro sem fora; não há "nós" sem "vocês".
A grande novidade de Jesus é lutar pela inclusão dos excluídos; mas, no reverso da medalha, há a exclusão dos exclusivistas. Um bom exemplo disso é a versão de Lucas das bem-aventuranças: aos quatro macarismos apontados, fazem-se corresponder quatro imprecações. Se os pobres são bem-aventurados, bem-vindos, incluídos, os ricos são mal-aventurados, encontram-se em situação de exclusão. Etc.
Pode-se dizer que é somente ameaça, que é apelo à conversão; ou que não se trata de excluir activamente, mas apenas de auto-exclusão; ou que no final, a misericórdia de Deus tudo superará; todavia, a questão mantém-se. De facto, o cobertor é pequeno: se se tapa a cabeça, destapam-se os pés; e se à força se quer tapar tudo, acaba-se por rompê-lo. Claro que a solução não é cortar os pés; mas também não é andar à procura de cobertores mágicos...
Faz-nos falta sonhar com os tempos messiânicos: o leão que brinca com o cordeiro, a criança que mete a mão na toca da víbora, o comunista que participa no comício do fascista, o homofóbico que dorme na mesma cama que o homossexual, Ratzinger e Boff a rezarem juntos... Mas também nos cabe compreeender, sem fáceis moralismos, porque é que a realidade tantas vezes contradiz os nossos ideais e bons propósitos.
JS
Caro JS:
Consideremos excluídos - sempre provisoriamente - os que colocam obstáculos ao amor entre os homens, e só estes. Estaremos de acordo, julgo, com Jesus.
Não será preciso convencer-te que a tua igreja ultrapassou, ao longo dos séculos, e continua a ultrapassar hoje, largamente, muito, muito largamente, este núcleo de exclusão.
Um abraço,
ZR.
Consideremos excluídos - sempre provisoriamente - os que colocam obstáculos ao amor entre os homens, e só estes. Estaremos de acordo, julgo, com Jesus.
Não será preciso convencer-te que a tua igreja ultrapassou, ao longo dos séculos, e continua a ultrapassar hoje, largamente, muito, muito largamente, este núcleo de exclusão.
Um abraço,
ZR.
Caro Zé Ribeiro.
Penso, como penso :) já lho ter dito, que faz uma selecção dos actos e dizeres jesuânicos do Novo Testamento, anulando aqueles "desagradáveis" acerca do fogo da geena, do arrancar o próprio olho, pé ou mão, da figueira morta, dos eunucos pelo reino dos céus, do jejum e oração, da completude da lei, etc.
O cristinismo não se reduz à antropologia, mas é também profundamente teológico (vertical, embora este termo ponha problemas conceptuais...) E é profundamente judaico, simplificá-lo enquanto abertura e universalização relativamente ao Antigo Testamento - o Novo Testamento só se compreende à luz do Antigo, há uma dialéctica de renovação e continuidade, e não de negação e ruptura.
É um pouco disparatado dizer apenas isto, mas gostei tanto dos seus comentários que só consigo calá-los em mim em alimento que me faz crescer, que pronto... (re)fica este reparo "técnico"...
Um abraço.
PS: Gostei mesmo muito!
Penso, como penso :) já lho ter dito, que faz uma selecção dos actos e dizeres jesuânicos do Novo Testamento, anulando aqueles "desagradáveis" acerca do fogo da geena, do arrancar o próprio olho, pé ou mão, da figueira morta, dos eunucos pelo reino dos céus, do jejum e oração, da completude da lei, etc.
O cristinismo não se reduz à antropologia, mas é também profundamente teológico (vertical, embora este termo ponha problemas conceptuais...) E é profundamente judaico, simplificá-lo enquanto abertura e universalização relativamente ao Antigo Testamento - o Novo Testamento só se compreende à luz do Antigo, há uma dialéctica de renovação e continuidade, e não de negação e ruptura.
É um pouco disparatado dizer apenas isto, mas gostei tanto dos seus comentários que só consigo calá-los em mim em alimento que me faz crescer, que pronto... (re)fica este reparo "técnico"...
Um abraço.
PS: Gostei mesmo muito!
Espiritualidade não tem de te estarrelacionado com crer em alguma coisa. Só quem precisa disso são os fracos.
A pergunta pertinente é: como é que alguns catolicos, perdidos nos seus folclores e nos seus medos ou gastando o seu tempo a preocupar-se com o que a hierarquia da igreja faz ou não faz, ainda conseguem entrever o que é a espiritualidade.
A pergunta pertinente é: como é que alguns catolicos, perdidos nos seus folclores e nos seus medos ou gastando o seu tempo a preocupar-se com o que a hierarquia da igreja faz ou não faz, ainda conseguem entrever o que é a espiritualidade.
Li os vossos comentários e primeiramente, apesar de não ser isso que primeiramente me moveu a escrever até porque à liça trazida por um Homosexual assumido não gosto da palavra paneleiro!Admiro a coragem deste seu leitor, é tudo, sei que de acordo com os seus principios e em paz com a sua sexualidade será feliz! E merece-o. Repudia-me que a Igreja instituida (de que não faço parte senão por baptizado e casamento) destrince entre o desejo homosexual e heterosexual no ordenamento de padres, uma vez que na vida eclesiástica o que conta é a eliminação desse desejo. Em favor do ZR é o que se me merece ser dito!
Conta agora o testemunho da minha fé, não me considero ateu, antes "pior", prefiro-me ver como gnóstico!Não me faz espécie a fé budista (sem Deus), como não me faz a católica e "ad absurdum" a das tribos de canibais que veneram um Totem! Não me faz espécie porque a religião acima de tudo possui uma função dentro das sociedades!
Não sou gnóstico daqueles que acreditam mais no Código de Da Vinci do que na Bíblia. Já tenho em casa os evangelhos de Nag Hammadi, mas nunca os li! Estou a ler a Biblia há cerca de 3 anos(acabei o Antigo Testamento e desde segunda feira li apenas o Evangelho segundo S. Mateus)e estou apaixonado pela leitura do Novo Testamento! A sério, que estou!
Jurei a mim mesmo (e Cristo diz: não jures, diz sim ou não), ou seja, disse não a ler qualquer outro livro que já possuo(desde o Museu Hermético da Taschen, a Caminho de Escrivá, aos Evangelhos Gnósticos, a Os Evangelhos Gnósticos de Elain Pagels, ou sequer o Código de Da Vinci ou O Evangelho segundo Jesus Cristo de José Saramago, à sabedoria de Hermes Trismegisto) ou que quero adquirir (como por exemplo O Corão, difícil de arranjar numa boa edição no pós 11 de Setembro de 2001)sem antes ler A Bíblia!
Não por estar mais certa, mas por a minha fé ter sido construida com base em Kierkgaard e Miguel Unammuno, dos quais adquiro, sempre que posso, qualquer edição.
São cristãos exemplares, exemplos para qualquer um!
Baptizei o meu Tiago porque afirmei com fé ao padre da paróquia da minha mulher (que é católica) que o faria educar no catolicismo. Nada me impede, como dizia James Joyce no Retrato do Artista quando Jovem, que uma coisa é o que aprende em casa, outra aquilo que lhe dizem os padres. Mas para mim, até pode ser padre se assim o entender.
A minha concepção religiosa, no entanto, aproxima-se dos budistas, eliminar o desejo para eliminar a dor e não reencarnar. Se pudesse pedir era isto que pedia! Por isso também não quero acreditar no catolicismo que promete vida eterna, que sinceramente não quereria, porque sem o desejo que me encaminha à fé já não seria eu mas um outro!Creio na sabedoria de Cristo, na sua palavra como profeta, mas não como O Salvador). Julgo muito rica a minha fé por beber em várias fontes!
Só mais uma pequena nota, os meus pais são comunistas convictos e têm fé na humanidade, eu não! Tive uma educação socialista e laica no colégio de Mario Soares e não me considero ateu ou laico. Gosto da fé, sou seu amigo, peregrinei cristãmente a Compostela e vou continuar a fazê-lo!
Não me agrada o anticlericalismo, nem comunista, nem socialista, do Eça ou do Guerra Junqueiro... Gosto de todo e qualquer ser humano que abrace uma fé. Mais ainda de quem a professa!
Admiro o caminho da fé e espero (com ou sem Deus) força para também eu o percorrer. Não estou a criar um Deus, sou um criado ao seu serviço!Espero pelo seu chamamento, uma vez que nunca me foi imposto!
Um abraço a todos, por ser tão boa uma troca de ideias civilizada e honesta!
Conta agora o testemunho da minha fé, não me considero ateu, antes "pior", prefiro-me ver como gnóstico!Não me faz espécie a fé budista (sem Deus), como não me faz a católica e "ad absurdum" a das tribos de canibais que veneram um Totem! Não me faz espécie porque a religião acima de tudo possui uma função dentro das sociedades!
Não sou gnóstico daqueles que acreditam mais no Código de Da Vinci do que na Bíblia. Já tenho em casa os evangelhos de Nag Hammadi, mas nunca os li! Estou a ler a Biblia há cerca de 3 anos(acabei o Antigo Testamento e desde segunda feira li apenas o Evangelho segundo S. Mateus)e estou apaixonado pela leitura do Novo Testamento! A sério, que estou!
Jurei a mim mesmo (e Cristo diz: não jures, diz sim ou não), ou seja, disse não a ler qualquer outro livro que já possuo(desde o Museu Hermético da Taschen, a Caminho de Escrivá, aos Evangelhos Gnósticos, a Os Evangelhos Gnósticos de Elain Pagels, ou sequer o Código de Da Vinci ou O Evangelho segundo Jesus Cristo de José Saramago, à sabedoria de Hermes Trismegisto) ou que quero adquirir (como por exemplo O Corão, difícil de arranjar numa boa edição no pós 11 de Setembro de 2001)sem antes ler A Bíblia!
Não por estar mais certa, mas por a minha fé ter sido construida com base em Kierkgaard e Miguel Unammuno, dos quais adquiro, sempre que posso, qualquer edição.
São cristãos exemplares, exemplos para qualquer um!
Baptizei o meu Tiago porque afirmei com fé ao padre da paróquia da minha mulher (que é católica) que o faria educar no catolicismo. Nada me impede, como dizia James Joyce no Retrato do Artista quando Jovem, que uma coisa é o que aprende em casa, outra aquilo que lhe dizem os padres. Mas para mim, até pode ser padre se assim o entender.
A minha concepção religiosa, no entanto, aproxima-se dos budistas, eliminar o desejo para eliminar a dor e não reencarnar. Se pudesse pedir era isto que pedia! Por isso também não quero acreditar no catolicismo que promete vida eterna, que sinceramente não quereria, porque sem o desejo que me encaminha à fé já não seria eu mas um outro!Creio na sabedoria de Cristo, na sua palavra como profeta, mas não como O Salvador). Julgo muito rica a minha fé por beber em várias fontes!
Só mais uma pequena nota, os meus pais são comunistas convictos e têm fé na humanidade, eu não! Tive uma educação socialista e laica no colégio de Mario Soares e não me considero ateu ou laico. Gosto da fé, sou seu amigo, peregrinei cristãmente a Compostela e vou continuar a fazê-lo!
Não me agrada o anticlericalismo, nem comunista, nem socialista, do Eça ou do Guerra Junqueiro... Gosto de todo e qualquer ser humano que abrace uma fé. Mais ainda de quem a professa!
Admiro o caminho da fé e espero (com ou sem Deus) força para também eu o percorrer. Não estou a criar um Deus, sou um criado ao seu serviço!Espero pelo seu chamamento, uma vez que nunca me foi imposto!
Um abraço a todos, por ser tão boa uma troca de ideias civilizada e honesta!
Interessantes todos estes comentários... muito interessantes e que nos ajudam a realmente reflectir sobre os fundamentos mais interiores da nossa fé.
Introduzo na discussão um outro dado: e que dizer dos que se afirmam "católicos não praticantes"? Terão eles e elas também uma espiritualidade? Ou será que a têm mas não têm tempo para "perder" com ela, com a espiritualidade e a fé?
Quem não pratica... bom... ou é aposentado ou deixou de ser aquilo que fazia... ou não é assim?
Introduzo na discussão um outro dado: e que dizer dos que se afirmam "católicos não praticantes"? Terão eles e elas também uma espiritualidade? Ou será que a têm mas não têm tempo para "perder" com ela, com a espiritualidade e a fé?
Quem não pratica... bom... ou é aposentado ou deixou de ser aquilo que fazia... ou não é assim?
Meu caro nils:
A palavra "paneleiro" é das palavras mais carregada de desprezo que existe na língua portuguesa; muito mais que "homossexual", que é descritiva, quase neutra no plano das emoções. Em sentido estrito, "paneleiro" é um homossexual masculino, que gosta de ser enrabado. Ora, por razões que seria muito interessante discutir, os povos da bacia do Mediterrâneo desenvolveram uma curiosísima aversão ao acto de enrabar, com estigmatização reforçada do enrabado. E, como o judaísmo/cristianismo/islão nasceram por aqui, a coisa espalhou-se. É um preconceito fortíssimo, que é muito difícil de combater. Já ninguém hoje leva a sério - a não ser 1/2 dúzia de imbecis - a maior parte das exclusões do Velho Testamento. A excepção é a homossexualidade, claro.
Que fazer quanto ao termo "paneleiro"?
Se o tivesses experimentado, atirado a ti como pedra, compreenderias que o objectivo primeiro de quem to atira é que sintas vergonha de sê-lo. Isto define a estratégia: assumir o termo, desorientar o ofensor, mostrar-lhe que a arma da vergonha e auto-culpabilização não funciona. Há outra razão: solidariedade para com os ofendidos.
Enfim, tecnicamente não sou estrictamente paneleiro: sou bissexual e, no que toca ao sexo homo, sou versátil ( quer dizer, enrabo e sou enrabado ). Mas a sociedade não se prende com estes detalhes comportamentais: sou socialmente apercebido como paneleiro.
Um abraço,
ZR.
A palavra "paneleiro" é das palavras mais carregada de desprezo que existe na língua portuguesa; muito mais que "homossexual", que é descritiva, quase neutra no plano das emoções. Em sentido estrito, "paneleiro" é um homossexual masculino, que gosta de ser enrabado. Ora, por razões que seria muito interessante discutir, os povos da bacia do Mediterrâneo desenvolveram uma curiosísima aversão ao acto de enrabar, com estigmatização reforçada do enrabado. E, como o judaísmo/cristianismo/islão nasceram por aqui, a coisa espalhou-se. É um preconceito fortíssimo, que é muito difícil de combater. Já ninguém hoje leva a sério - a não ser 1/2 dúzia de imbecis - a maior parte das exclusões do Velho Testamento. A excepção é a homossexualidade, claro.
Que fazer quanto ao termo "paneleiro"?
Se o tivesses experimentado, atirado a ti como pedra, compreenderias que o objectivo primeiro de quem to atira é que sintas vergonha de sê-lo. Isto define a estratégia: assumir o termo, desorientar o ofensor, mostrar-lhe que a arma da vergonha e auto-culpabilização não funciona. Há outra razão: solidariedade para com os ofendidos.
Enfim, tecnicamente não sou estrictamente paneleiro: sou bissexual e, no que toca ao sexo homo, sou versátil ( quer dizer, enrabo e sou enrabado ). Mas a sociedade não se prende com estes detalhes comportamentais: sou socialmente apercebido como paneleiro.
Um abraço,
ZR.
A discussão está do melhor!
de tudo o que foi escrito, retiro esta frase do "nils". Não sei bem qual o significado que ele lhe dá. A mesma coisa, ou as mesmas palavras, podem significar ou ecoar coisas diferentes, para pessoas diferentes e até em momentos diferentes.
"...não quero acreditar no catolicismo que promete vida eterna, que sinceramente não quereria, porque sem o desejo que me encaminha à fé já não seria eu mas outro!"
Caramba! Eu católica confessa, o que mais desejo é isto!
Explico: não renego nada do que sou. Sou tão teimosa, que o Espírito em mim (e é isso que eu considero vida espiritual - deixar-se moldar/conduzir pelo Espírito)tem de trabalhar a dobrar ou atriplicar, sei lá. Mas espero que, na fé, o Espírito me transforme. E noutra sem problemas nenhuns. Sem dúvida que é a maior ambição da minha vida. Na fé, quero ser outra.
Obrigada, nils, porque me ajudaste a exprimir, o que é para mim, o maior desejo.
E por aqui, nestas partilhas se vê que vida espiritual é comum a todos. A "linguagem" do Espírito é que é conforme a cada um, como não podia deixar de ser.
de tudo o que foi escrito, retiro esta frase do "nils". Não sei bem qual o significado que ele lhe dá. A mesma coisa, ou as mesmas palavras, podem significar ou ecoar coisas diferentes, para pessoas diferentes e até em momentos diferentes.
"...não quero acreditar no catolicismo que promete vida eterna, que sinceramente não quereria, porque sem o desejo que me encaminha à fé já não seria eu mas outro!"
Caramba! Eu católica confessa, o que mais desejo é isto!
Explico: não renego nada do que sou. Sou tão teimosa, que o Espírito em mim (e é isso que eu considero vida espiritual - deixar-se moldar/conduzir pelo Espírito)tem de trabalhar a dobrar ou atriplicar, sei lá. Mas espero que, na fé, o Espírito me transforme. E noutra sem problemas nenhuns. Sem dúvida que é a maior ambição da minha vida. Na fé, quero ser outra.
Obrigada, nils, porque me ajudaste a exprimir, o que é para mim, o maior desejo.
E por aqui, nestas partilhas se vê que vida espiritual é comum a todos. A "linguagem" do Espírito é que é conforme a cada um, como não podia deixar de ser.
É claro que o meu comentário está carregadinho daquela expressão de S. Agostinho: "Fizeste-nos para Vós, Senhor, e o nosso coração não descansa, enquanto não chegarmos lá!"
Zé Ribeiro
a transcrissão está um bocado trapalhona, é mais isto:
"Fizeste-nos para Vós, Senhor, e o nosso coração não descansa enquanto não repousa em Vós."
a transcrissão está um bocado trapalhona, é mais isto:
"Fizeste-nos para Vós, Senhor, e o nosso coração não descansa enquanto não repousa em Vós."
O adormecimento é o pai do não cretne, somente isso, somente mero adormecimento.
Cabe aos que o vêm dormir ajudá-lo a acordar, como?
Levem-no a pensar... pois se ele perder 15 minutos por dia somente a pensar... ele acorda.
Caí neste blogue "por acaso" e até agora estou a gostar do que vejo, parabéns.
Vou colocá-lo no meu, espero que não se importe. (http://mercurialidades.blogspot.com)
Cabe aos que o vêm dormir ajudá-lo a acordar, como?
Levem-no a pensar... pois se ele perder 15 minutos por dia somente a pensar... ele acorda.
Caí neste blogue "por acaso" e até agora estou a gostar do que vejo, parabéns.
Vou colocá-lo no meu, espero que não se importe. (http://mercurialidades.blogspot.com)
Manuel dijo...
Acabado de chegar de um fim de semana intenso, vejo que a discussäo por aqui continuou animada. Ainda bem!
Nils.
Obrigado pelas tuas palavras. Acho que percebo o que dizes e sei que é uma opiniäo mais ou menos partilhada por outras pessoas que conheço, com algumas ressalvas.
Ao ler as tuas palavras lembrei-me de uma coisa que me disse ontem uma pessoa amiga sobre a celebraçäo de um dos sacramentos: "Eu estou desencantada com a Igreja, mas estas coisas continuam a ser importantes para mim; é como a família: pode näo ser a que desejaríamos, mas é a nossa e é nela que temos de tentar ser felizes..."
Sei bem que as questöes que abordas tocam outros temas. Mas foi o que me veio à cabeça...
Zé,
Esta reflexäo näo seria a mesma sem ti! Obrigado.
MC,
Acho que concordo contigo. Ser discípulo implica deixar-se transformar. Näo se trata de ser outro... mas melhor do mesmo :)
FC,
Näo acho que se trate só (ou sempre) de adormecimento. Pode até ser uma atitude muito desperta.
Obrigado por linkares o Adro.
Acabado de chegar de um fim de semana intenso, vejo que a discussäo por aqui continuou animada. Ainda bem!
Nils.
Obrigado pelas tuas palavras. Acho que percebo o que dizes e sei que é uma opiniäo mais ou menos partilhada por outras pessoas que conheço, com algumas ressalvas.
Ao ler as tuas palavras lembrei-me de uma coisa que me disse ontem uma pessoa amiga sobre a celebraçäo de um dos sacramentos: "Eu estou desencantada com a Igreja, mas estas coisas continuam a ser importantes para mim; é como a família: pode näo ser a que desejaríamos, mas é a nossa e é nela que temos de tentar ser felizes..."
Sei bem que as questöes que abordas tocam outros temas. Mas foi o que me veio à cabeça...
Zé,
Esta reflexäo näo seria a mesma sem ti! Obrigado.
MC,
Acho que concordo contigo. Ser discípulo implica deixar-se transformar. Näo se trata de ser outro... mas melhor do mesmo :)
FC,
Näo acho que se trate só (ou sempre) de adormecimento. Pode até ser uma atitude muito desperta.
Obrigado por linkares o Adro.
Caro Manuel:
Eu é que te agradeço a oportunidade dada.
Faz muito bem falar destas coisas, mas é muito difícil encontrar alguém com quem: a maioria das pessoas - a maioria dos crentes! - olha para nós como se fôssemos marcianos quando queremos falar delas.
A tua Igreja devia ter um "espaço" com contactos em carne e osso, o que este meio não permite, de "desabafos" religiosos, em que fôssemos livres de dizer os disparates que nos apetecesse sobre Deus e o Homem, sem que o padre presente fosse sentido como um polícia do Sagrado. Só não escrevo "algo institucional" porque tenho medo de como isso podia ser entendido e das consequências nefastas. Mas julgo que me fiz entender ...
Obrigado,
ZR.
Eu é que te agradeço a oportunidade dada.
Faz muito bem falar destas coisas, mas é muito difícil encontrar alguém com quem: a maioria das pessoas - a maioria dos crentes! - olha para nós como se fôssemos marcianos quando queremos falar delas.
A tua Igreja devia ter um "espaço" com contactos em carne e osso, o que este meio não permite, de "desabafos" religiosos, em que fôssemos livres de dizer os disparates que nos apetecesse sobre Deus e o Homem, sem que o padre presente fosse sentido como um polícia do Sagrado. Só não escrevo "algo institucional" porque tenho medo de como isso podia ser entendido e das consequências nefastas. Mas julgo que me fiz entender ...
Obrigado,
ZR.
Não está directamente ligado com o post, e "vocês" já devem mais que conhecer a coleção - mas pode haver alguém que passe por aqui e que não conheça.
Em 2005, a Gradiva começou uma coleção "Religião Aberta", sob direção do Stilwell e do Oliveira Martins. Já publicou dois títulos:
Quesnel, M. "Jesus: o Homem e o Filho de Deus". Gradiva, Lisboa, Março 2005.
Hervieu-Léger, D. "O Peregrino e o Convertido: a Religião em Movimento". Gradiva, Lisboa, Agosto 2005.
No prelo está:
Sacks, J. "A Dignidade da Diferença".
São livros de divulgação, mas muito sérios. E nada "sectários"... E - vantagem inestimável nos tempos que correm - baratinhos, à volta de 15 euros.
Descobri-os ontem, numa ida inesperada a Lisboa, en bouquinant num tempinho livre. E li-os esta noite num trago. Vale a "pena".
( O primeiro é muito melhor que o segundo. )
ZR.
Em 2005, a Gradiva começou uma coleção "Religião Aberta", sob direção do Stilwell e do Oliveira Martins. Já publicou dois títulos:
Quesnel, M. "Jesus: o Homem e o Filho de Deus". Gradiva, Lisboa, Março 2005.
Hervieu-Léger, D. "O Peregrino e o Convertido: a Religião em Movimento". Gradiva, Lisboa, Agosto 2005.
No prelo está:
Sacks, J. "A Dignidade da Diferença".
São livros de divulgação, mas muito sérios. E nada "sectários"... E - vantagem inestimável nos tempos que correm - baratinhos, à volta de 15 euros.
Descobri-os ontem, numa ida inesperada a Lisboa, en bouquinant num tempinho livre. E li-os esta noite num trago. Vale a "pena".
( O primeiro é muito melhor que o segundo. )
ZR.
Zé,
Obrigado pela sugestäo.
Sabia que existiam, mas näo li nem um nem outro. A ver se este veräo...
Abraço
Obrigado pela sugestäo.
Sabia que existiam, mas näo li nem um nem outro. A ver se este veräo...
Abraço
MC,
talvez não me tenha exprimido bem. O que queria dizer era que se não for transformado em vida não espero da morte que o faça.
ZR,
continuo a não gostar da terminologia, mas é verdade que a igreja tanto esquece de perdoar os sodomitas, como esquece de lembrar que a "nossa" cidade é mais dificil de perdoar que Sodoma ou Gomorra (está na Bíblia). Ou que o reino dos céus não é para os ricos (coisa católica, não protestante).
Manuel,
obrigado por passares pelo Monstruosidades!
talvez não me tenha exprimido bem. O que queria dizer era que se não for transformado em vida não espero da morte que o faça.
ZR,
continuo a não gostar da terminologia, mas é verdade que a igreja tanto esquece de perdoar os sodomitas, como esquece de lembrar que a "nossa" cidade é mais dificil de perdoar que Sodoma ou Gomorra (está na Bíblia). Ou que o reino dos céus não é para os ricos (coisa católica, não protestante).
Manuel,
obrigado por passares pelo Monstruosidades!
nils
eu da morte não sei nada. E tenho medo dela que me pelo. O que não me vale de nada, porque não há maneira de lhe fugir.
Mas tenho uma intuição que não é de há muitos anos, que na morte, sim, acontecerá a devida purificação. Tiro isto da minha experiência. Vou tentar explicar:
Já lá vão quase cinquenta, que passaram a correr, e continuo com muito pouco que se aproveite, não acredito que, no tempo que me resta, o panorama vá mudar muito. Acredito na vida eterna, que teve um início e não terá fim. Em vez de me desesperar com os meus insucessos, prefiro confiar que Deus, lá terá o seu plano para me redimir. Se acredito que Deus é amor, não posso esperar outra coisa dele. Acredito que quando vir de verdade esse plano, me vou render. Conheces os passos da conquista? É isso de certeza, mas ainda em melhor.
Entretanto, por cá, vou tentando preparar o coração. Já sei que a salvação não é conquista minha.
Isto passa-se um bocadinho diferente que com os humanos. Eu vou ser (ou estou sendo) seduzida. Não preciso de seduzir.
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eu da morte não sei nada. E tenho medo dela que me pelo. O que não me vale de nada, porque não há maneira de lhe fugir.
Mas tenho uma intuição que não é de há muitos anos, que na morte, sim, acontecerá a devida purificação. Tiro isto da minha experiência. Vou tentar explicar:
Já lá vão quase cinquenta, que passaram a correr, e continuo com muito pouco que se aproveite, não acredito que, no tempo que me resta, o panorama vá mudar muito. Acredito na vida eterna, que teve um início e não terá fim. Em vez de me desesperar com os meus insucessos, prefiro confiar que Deus, lá terá o seu plano para me redimir. Se acredito que Deus é amor, não posso esperar outra coisa dele. Acredito que quando vir de verdade esse plano, me vou render. Conheces os passos da conquista? É isso de certeza, mas ainda em melhor.
Entretanto, por cá, vou tentando preparar o coração. Já sei que a salvação não é conquista minha.
Isto passa-se um bocadinho diferente que com os humanos. Eu vou ser (ou estou sendo) seduzida. Não preciso de seduzir.