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terça-feira, outubro 10, 2006

Só já falta o Purgatório 

Igreja acabou de vez com o Limbo .

Comments:
Brevíssimos comentários ao texto para que remeteste:

i) É um consolo para os pais crentes das crianças mortas sem serem baptizadas e que, portanto, não tiveram funeral religioso saberem que o limbo é somente "uma hipótese teológica".

ii) Como na travessia do Atlântico pelos navios negreiros as "peças" ( 1 peça = 1 homem adulto; 1/2 peça = 1 mulher adulta; etc. ) morriam aos montes, o bispo de Luanda, na praia, sentado na sua cátedra, baptizava colectivamente os escravos que embarcavam. Os felizes tinham o céu garantido - a menos de concupiscência na viagem, claro.

iii) Como definiu o Vaticano II, o baptismo não é essencial para a salvação, se a pessoa não teve acesso a Jesus Cristo. Claro que há problemas: conheço pessoas a quem Cristo foi apresentado mas que o rejeitaram. Mas foi mesmo apresentado? Conheço muita gente que, julgando Jesus Cristo pela Sua Igreja, o rejeita. A quem a culpa? À pessoa, ou à Igreja?

iv) Quanto a quem morreu antes da vinda de Jesus Cristo, o Símbolo dos Apóstolos dá a resposta: " Desceu à mansão dos mortos". Claro: para os resgatar e os levar conSigo.

Bom trabalho,
ZR.
 
"Já só falta o Purgatório."
Bom, acabar com o Purgatório significaria uma revolução total. Tanto na doutrina como na entrada de fundos.
 
Pois é, pois é, David...
Há por aí muito dinheiro entrado com as "Almas do Purgatório"!!!
 
Huuuum… o Purgatório corresponde à noção de purificação para a comunhão com o amor absoluto que transcende a morte… É uma acção do próprio Deus em nós, na morte… Trata-se dum lugar tópico, e não geográfico, como é evidente… Não percebo muito bem… quem o anula deve explicar como é que essa purificação total ocorre na temporalidade vivida, não sei… Ou então a sua impossibilidade, e consequentemente a impossibilidade de comunhão total com Deus… Porque a comunhão não é só com o mediador mas com o mediado (ou com o Pai e não só com o Filho etc)… Abraços.
 
Eu defendo o Purgatório: Quando morremos, não para dentro do Nada, mas para dentro de Deus, há um processo de purificação. Claro que não há um "lugar", nem um "tempo" ( categorias humanas, que não fazem sentido neste processo ). Não havendo um tempo não faz sentido rezar para que se abrevie a passagem pelo purgatório deste ou daquele fiel defunto. Nem - horror! - pagar missas para tal, como minha avó materna fez pelo meu avô ...

ZR.
 
Ah, ok, não tinha percebido... É que também defendo o purgatório ;)

O problema das categorias humanas é que temos de as usar para nos relacionarmos, inclusive com Deus... Desde que se reze com amor, na mais larga acepção...

Isso de pagar missas, não conheço muito bem... Os padres que falem :)

Perante Deus, estamos sempre errados (fechamo-lo sempre nalgum lado, mesmo quando o silenciamos mistica ou ateisticamente, e esta é boa como eco ao pecado original lá em baixo...)
 
Olá a todos!

Zé e Vitor,
Eu näo defendo o Purgatório, ao contrário dos meus estimados e estimáveis amigos. E näo o defendo porque näo lhe percebo nem a origem, nem a finalidade.
Percebo o que dizem sobre a purificaçäo, mas isso, desculpem-me a franqueza, säo mais suposiçöes e categorizaçöes humanas. Ou näo?

David,

Irónico e mordaz, lá vais desvanecendo a minha esperança de ecumenismo blogosférico!!! :)
O Small Church anda muito parado. O tempo das vindimas näo deveria já ter acabado?
 
Recomenda-se "O nascimento do Purgatório", de Jacques Le Goff.
 
Finalmente!
 
Aqui está mais um (de muitos ainda) tabús que a Igreja tem de enfrentar sériamente...
 
Pois, Manel… mas o que é que em nós não é feito a partir de categorizações humanas… caramba, tens de apoiar a escada também na terra, não ?... Ou vais apoiá-la só no céu ?… A graça trabalha adentro e a partir da natureza, ou não ?... Sei lá… ;) Bom dia, que raio…

Anónimo, obrigado pela indicação bibliográfica... Essa estória histórica interessa-me... Enfim, mais um que vai ganhar bolor para a mesa de cabeceira e fazer perder uma ou outra nota na carteira ;)
 
Sim, tens razão, são suposições e categorizações ( tchi ... que palavra ) humanas.

Não creio - mas não sou especialista na matéria - que haja referência escritural aplicável.

Não é que isso seja muito importante para mim: tomo a Bíblia como um caminho para Jesus e só isso. O Velho Testamento interessa-me para compreender a tradição religiosa em que Ele se situa. Os Actos e as Epístolas como testemunhos de quem esteve perto d'Ele.

Mas é nos Evangelhos que Ele me fala. E é sob a luz do que eu presumo ser o exemplo d'Ele que procuro pensar/sentir e agir. Ora, devo reconhecer que, sob esta luz, o Purgatório é dispensável. E não ignoro que pode ser prejudicial: sei que foi "inventado" à volta do ano mil e que rezar pelas almas do purgatório pode tornar-se - tornou-se!! - uma fonte de controlo e de dinheiro para a Igreja romana.

Mas, ao mesmo tempo, tens que pensar que todos somos pecadores - e grandes! - e que a entrada "directa" em Deus assusta ... Vejo-o mais como um "amortecedor" de uma transformação que pode ser ansiada, mas que não deixa de ser effrayante.

Custa-me pôr de lado essa aspirina ...

E depois, para quem não me conhece bem, eu sou mais intuitivo que racional ( como todo o paneleiro que se preza, mesmo matemático ). Neste Agosto, a caminho de Santiago, passei por Iria Flavia às 6 e 1/2 da manhã; junto à igreja - a antiga sé - um cemitério de muitos séculos ocupa todo o adro, que é muito grande. E foi evidente ( não me perguntes porquê ) para mim que era preciso rezar pelas almas no purgatório; não no sentido de lhes abreviar um sofrimento, claro; mas num sentido ... que não te sei dizer ... Requiem aeternam dona ei, domine, et lux perpetua luceat ei. Sim, eu sei que não está obrigatoriamente associado ao purgatório ( mas o texto é mais ou menos contemporâneo da crença nele ), eu sei ... Mas eu não sou racional, caneco!!!

'braço,
ZR.
 
Manuel

Como vês as vídimas lá acabaram... em breve voltarei aos posts normais...
Pois, esta questão do purgatório é mesmo uma dificuldade grande. Porque tem duas ideias subjacentes: 1) Que é possível fazer qualquer coisa pela alma depois da morte física - tirando um pouco da responsabilidade individual na presente vida; 2) Que a igreja é precisa para essa purificação (é através dela que o processo acontece). Isto para além das compras que se podem fazer, claro.

Zé Ribeiro e Vitor Mácula

As Escrituras dizem que Jesus levou sobre Si todos os nossos pecados - foi para isso que morreu. É preciso mais alguma coisa? Perante Deus, com a morte e ressurreição de Cristo, estaremos puros.
 
Caro David.

Portanto eu não preciso de acrescentar esforço meu ao sacrifício de Cristo… :P

Nãããã… Falta a efectividade e realidade existencial da renovação… Ou achas que estás na tua realidade efectiva, imaculado ?... É que, se pensarmos que nada disso do pecado « entra » em Deus, terás que tomar uma banhoca antes do mergulho ;)

Pronto, isto relativa e inicialmente para a tua interpelação directa.

Quanto ao ser preciso a igreja, isso depende do que queres dizer com igreja… Referes-te a poder-se rezar pelos mortos ?...

Abraço.
 
Aaaaah... pois, as "compras" espirituais... com carcanhol não dá... com suor e sangue, penso que depende do como e que destes... mas não é na estrutura de troca, mas mais na de entrega e transformação de si... sei lá... esta é como as missas pagas... continuo a achar que os mais indicados para de tal falar serão os padres paroquiais... :P
 
Caro Vítor

"Portanto eu não preciso de acrescentar esforço meu ao sacrifício de Cristo…"
Não, não precisas.
Cristo deixou o trabalho a meio? Uma das vantagens de ser Deus foi poder fazer uma obra perfeita. E isto mata qualquer hipótese de orgulho ou auto-indulgência. Não podemso fazer nada, mesmo nada, para a nossa salvação. Temos de confiar, crer, em Cristo totalmente.
 
David, isso da graça e da ética… Vamos por partes, até porque é um diálogo que está viciado por remissão a outros já seculares… Não estás a dizer que não te é requerido esforço para não pecares, pois não?... Ou que a conversão é uma dádiva que não implica resposta minha?... Nem que o amor não requer esforço?...

Outro ponto é: se o acto de salvação é perfeita e completa e acabadamente feito por Deus, estamos todos salvos, seja o que for que fizermos?...

Reitero o que disse ao Zé Ribeiro… Estes meus dislates são perplexidades e buscas… Eu não sei como se passa… Orígenes fazia derivar da infinita misericórdia e perfeição da salvação, a redenção da criação inteira na Parusia, incluindo a de Satanás… É plausível, mas põe-me o problema, visto para mim a salvação implicar um acto de vontade, quando se é um ser mental: a impossibilidade da negação, tornando a salvação uma imposição, o que é contrário ao que pressinto ser a relação de Deus com a liberdade…
 
Um acrescento intelectualoide, porventura curioso: eu quando leio os textos da polémica entre Erasmo e Lutero acerca do livre/servo arbítrio, penso que ambos têm sentido, ou melhor, que o sentido se dá na dinâmica e tensão entre ambas inquirições... Ou algo do género... ;)
 
Vitor

Respondendo às perguntas:
"Não estás a dizer que não te é requerido esforço para não pecares, pois não?"
Não, claro que não. Resistir à tentação é dos maiores esforços que conheço. Mas essa luta não é para me salvar mas para cumprir a lei de Deus.
"Ou que a conversão é uma dádiva que não implica resposta minha?"
Sim, implica. Tens que aceitar ou rejeitar a salvação de Cristo.
"se o acto de salvação é perfeita e completa e acabadamente feito por Deus, estamos todos salvos, seja o que for que fizermos?"
Não. O Novo Testamento é bem claro. A salvação é perfeita e completa para os escolhidos ( e lá entramos nós na predestinação vs. livre arbítrio...)
Bom, mas para mim o essencial é que não podendo fazer nada pela salvação somos chamados a cumprir a lei de Deus. Não por interesse (a nossa salvação) mas por amor ao nosso salvador.
 
Ces vieux trucs refont toujours surface ...

Um dia, falarei sobre o assunto.

Para já digo que, tendo, na minha adolescência, encarrilado para a salvação pela fé, com o tempo esta me pareceu de tal maneira desvalorizadora do homem, que acabei por abandonar tal posição.

No fundo, acho que é uma falsa questão: Vd o comentário que fiz ao post anterior. Mas, se insistirmos nela, o ponto de vista católico está menos afastado do que eu penso do que o reformado.

E quanto à predestinação - isso nem se fala: é sinal de uma grande confusão metodológica entre o âmbito de Deus e o âmbito do homem. Também aqui estou de acordo com os meus irmãos católicos ( hem? ... não disse "romanos"! ) e não com os meus irmãos reformados.

Ora, mais uns anitos, os nossos corpinhos a apodrecer e - pela misericórdia de Deus - todos juntos como irmãos que somos. Nessa altura, vamo-nos rir às gargalhadas com estas questões e estas diferenças ...

Beijinhos a todos,
ZR.
 
Pois, Zé… Eu pensinto que as duas posições (para ilegitimamente simplificar ;) exprimem pertinentes lados da questão… Penso que a questão é ligeiramente paradoxal, um pouco como nos laços de amor : se a minha felicidade inclui a do outro, quando faço pelo outro também estou a fazer por mim… Ou nos termos da questão : se a vontade de Deus é que todos se salvem, fazer pela minha salvação é fazer a vontade de Deus… Amar o salvador é querer a salvação, auto-implicam-se substancialmente, digamos assim.

Mas claro que nos riremos às gargalhadas ;)

Aproveito, já que falaste no teu post anterior, que o teu comentário (é a mim que é perguntado « Quem é este homem ? ») é esplendorosamente pertinente… Eu às vezes fico um bocado à nora quando me dizem com toda a naturalidade que crêem na consubstancialidade etc, e tantas vezes numa acusação e condenação dos que não crêem ou se confundem (de Pilatos a Judas)… Eu gostava de saber o que faríamos se conhecessemos um tipo qualquer no Bairro Alto ou no Cais do Sodré, rodeado de prostitutos/prostitutas, operários, professores e por aí fora, conversando e bebendo uns copos, ouvíssemos dizer que umas coisas estranhas de vez em quando fazia, esse tipo depois fosse para os Estados Unidos, vindo nós a saber que tinha sido condenado à morte na cadeira eléctrica e depois aparecendo uns gajos a dizer-nos : aquele tipo, era o verbo do Deus omnipotente e criador do céu e da terra, aquele tipo era o Deus feito humano… Quantos de nós iam na conversa… Nós acreditamos é na tralha secular (Igreja, teologias, etc) mas Nele, realmente Nele… quem sabe a sua fé ?...

Não sei se me expliquei muito bem… ;)

Abraço, bom dia
 
Quanto à existência do Purgatório, a Igreja o deduz das palavras do próprio Jesus, quando afirmou que os pecados contra o Espírito Santo não serão perdoados nem nesse século, "nem no século futuro" (de onde se conclui que certas faltas podem ser perdoadas no "século futuro"). Vide Mt 12, 32.

Desde seus primeiros anos, a Igreja ora pelos defuntos. Há inscrições antiquíssimas em sepulcros em que se pede orar pelo falecido. E essa era uma prática que vinha antes da Igreja, vide 2Macabeus 12,46. Portanto, a Igreja não "inventou" a oração pelos mortos.

Orar pelo defunto não lhe retira a responsabilidade pessoal nem diminui a força da salvação de Cristo. Ocorre que vivemos uma verdadeira comunhão (como afirmamos ao rezar o Credo), e muito agrada ao Senhor que rezemos pelos irmãos: assim vamos fazendo nosso coração se conformar ao Coração de Jesus, o nosso Intercessor junto ao Pai.

Por outro lado, lembremos que para Deus não há passado, presente ou futuro, pois um dia para Ele são como mil anos, e mil anos são como um dia. Deus pode dar graças a quem viveu antes de nós, tendo em vista a oração que já de antemão sabia que faríamos.

Aqui existe um mistério da oração cristã, quando Deus atua por nosso pedido, e não atuaria se não pedíssemos. Como pode ser isso possível se Deus não depende de nós para ser bom? Os relatos das bodas de Caná, ou do paralítido que foi descido pelo telhado por seus amigos, nos mostram como o Senhor reserva certas graças para serem concedidas a pedido (no primeiro caso, pedido de Maria; no segundo caso, o esforço dos amigos - lembremos que na cura do paralítico a Escritura diz que Jesus o curou "vendo a fé deles", no plural.

Portanto, o purgatório existe, é dogma de fé já definido em concílios anteriores, colhido do próprio ensinamento e comportamento dos Apóstolos. Já o limbo sempre foi tão-somente uma hipótese teológica. A Igreja está sempre discernindo, e pode ter chegado a hora de definir que o limbo não existe. Isso não quer dizer que a Igreja vai rever qualquer dogma que seja.

É lamentável como uma tomada de posição da Igreja desperte leituras tão equivocadas como um artigo que saiu aqui no Brasil, que, em tom sarcástido, dizia que "Ir para o céu ficou mais fácil". Por que zombar assim da Igreja?
 
Danilo

A dedução a partir das palavras de Jesus parece-me algo rebuscada. Aliás, os ensinos de Jesus eram claros, "sim sim, não não."
Como sabe, II Macabeus faz parte dos livros que os protestantes/evangélicos consideram apócrifos ou não inspirados. É significativo que seja aí que encontra a única referência à oração pelos mortos.
Não conheço muito o meio católico romano mas julgo que as missas que se mandam rezar pelos mortos têm menos a ver com a comunhão entre irmãos e mais com um pagamento a favor da alma do defundo. Lembre-se que a Reforma de Lutero teve um grande impulso precisamente nesta área. Para conseguir dinheiro para contruir a Catedral de S. Pedro apregoava-se na Europa a seguinte indulgência:
- Quando a moeda tilintar no fundo caixa uma alma se elevará do purgatório.
 
Prezado David, falo de coração e como alguém que vive no meio católico romano (aliás, obrigado por sua sinceridade em dizer que conhece pouco esse meio): as missas pelos mortos são vistas por todos os católicos como advindas da comunhão entre nós. Falo dos católicos por opção, e não os por tradição da família.

Há, de fato, um costume de se demonstrar a gratidão pela missa oferecida: algumas vezes, se levam flores para se colocar nos altares, outras vezes se prefere dar dinheiro (que é o bem mais volátil, e por isso mais útil, pois com isso se ajuda a pagar as contas dos templos, luz, água, manutenção, etc.). E sabe quanto se costuma doar aqui na minha região (Brasil)? O equivalente a metade de um pão de 30 gramas. De qualquer maneira, é um ato livre.

De fato, Lutero negou a inspiração divina do livro de Macabeus, mas que era considerado tal por milênios: os próprios judeus da época e região de Jesus (e também o próprio Jesus, evidentemente), o consideravam Palavra de Deus.

A negação de Lutero não infirma o fato de que sempre foi prática dos cristãos (estudos arqueológicos demonstram isso às escâncaras) a oração pelos falecidos.
 
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