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sexta-feira, março 31, 2006

Sigo-Te... 

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo,
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
Texto: Sophia de Mello-Breyner Andresen
Foto: Dave April's

quinta-feira, março 30, 2006

Este post näo diz nada 

Apetece-me escrever qualquer coisa, mas näo sei exactamente o quê. Limito-me, pois, a ocupar estas duas ou três linhas para que os internautas que vêm aqui parar registem estes sinais vitais, descartando assim as hipóteses de desaparecimento, morte ou fuga...
Há quem consiga sintetizar as mais complexas ideias em poucas palavras. Mas deve-se também valorizar este nobre esforço a que hoje me dedico: pôr palavras por ordem, tentando näo dizer nada.

Bom dia 

Contigo por el mundo!
Con mi canto!
Con el vuelo entreabierto
de la estrella,
y con el regocijo
de la espuma!

Voy a cumplir con todos
porque debo
a todos mi alegría.

No se sorprenda nadie porque quiero
entregar a los hombres
los dones de la tierra,
porque aprendí luchando
que es mi deber terrestre
propagar la alegría.
Y cumplo mi destino con mi canto.
Pablo Neruda

terça-feira, março 28, 2006

Plasticidade interpretativa 

Acho graça à facilidade com que certa gente fundamenta os seus devaneios com passagens bíblicas. Quando falamos de moral, então, irrompem biblistas como cogumelos. É como no futebol: são os exegetas de bancada.

* * *

Trouxeram-lhe entäo uma mulher, surpreendida em pecado. "Quem nunca tiver errado, que atire a primeira pedra". E vai um xico esperto, apanha um calhau, faz pontaria e acerta, em cheio, na testa da pobre mulher. O Mestre, surpreendido e irritado, pergunta-lhe: "Nunca erraste?" E responde o exegeta: " A esta distância? Nunca!"

Bom dia 










"Não abandones as tuas ilusões.
Sem elas podes continuar a existir,
mas deixas de viver"


Mark Twain

segunda-feira, março 27, 2006

A chatice dos emigrantes 

Antes morriam muitos no Estreito. Agora, continuam a morrer no Estreito, mas fala-se mais dos que morrem entre a Mauritânia e as Canárias. Quase todos os dias. Balsas e balsas deles. Pateras e pateras deles. O sítio onde morrem varia, conforme as modas... Mas morrem.
Outros näo morrem, mas säo repatriados à chegada. Depois de muitos dias esfomeados e desidratados. "Para trás, que aqui a lotaçäo está esgotada".
Durante uns tempos, o governo de Marrocos abandonava no deserto os que eram repatriados. Levá-los até à fronteira seguinte saía muito caro. Como era "gentinha sem valor", näo justificava o investimento. Depois os jornalistas fizeram barulho. Foi uma maçada. Já näo os deixam no deserto. Embora continuem a achar que säo "gentinha"...
Espanha näo os abandona no deserto. Porque näo tem deserto... Mas está farta de tantos negros a darem à costa... Ainda por cima tem de dizer que os respeita, etc.. etc... e tal. Mas depois... "para as palhotas com eles, que aqui estamos lotados".
Fechados neste condomínio privado de luxo que é a Europa, há muito que perdemos a noçäo do ridículo. E da vergonha. Já nem percebemos que estas vagas de "negros esfomeados" que se lançam ao mar, arriscam a vida ou morrem mesmo, näo estäo a pedir uma ajuda; estäo a pedir o que é deles!

Bom dia 



Neste momento o meu desejo é realizar-me.
Mas como o irei conseguir,
a menos que me tome num planeta
onde habitam vidas dotadas de inteligência?
Não é esse o objectivo de cada um de nós?

Uma pérola é um templo
construído pela dor à volta de um grão de areia.
Que nostalgia nos construiu o corpo e à volta de que grãos?

Quando Deus me lançou como um seixo
para esse lago maravilhoso,
perturbei a sua superfície em círculos inumeráveis.
Mas quando alcancei as profundezas,
tornei-me muito calmo.

Concedei-me o silêncio e afrontarei a noite.
Conheci um segundo nascimento
quando o meu corpo e a minha alma se amaram e desposaram.
Kahlil Gibran

sexta-feira, março 24, 2006

Problemas de linguagem 

Recebi um correio electrónico a convidar-me para assistir a uma conferência, proferida por gente respeitável e credível, sobre a questäo da Procriaçäo Medicamente Assistida. O convite dizia assim:

Portugal não sabe, mas está em discussão na Assembleia da República uma lei que vai permitir situações como:
- Barrigas de aluguer;
- Gerar bébés através de sémen e/ou óvulo de um homem e mulher que não vão ser os seus pais legítimos;
- Inseminação artificial de mulheres sózinhas que vão dar à luz bébés que podem ser destinados a pares homossexuais;
- Reprodução post mortem: com recurso a sémen retirado a cadáveres;
- criação de embriões humanos excedentários cujo destino é a congelação, a investigação científica que leva à sua destruição ou simplesmente o caixote do lixo;
e a vasta lista continua...

Venha-se informar.
É urgente exigir um Referendo sobre a PMA.
* * *
Quem escreveu o texto deste convite tem, certamente, as melhores intençöes. Mas ainda näo percebeu que esta linguagem alarmista, pouco precisa e ligeiramente histérica tem um efeito contrário ao desejado. Pelo menos no que se refere a pessoas como eu, causa de imediato desconforto e desconfiança. Meio caminho andado para näo ir à conferência e sentir aversäo à causa. Apesar dos conferencistas me merecerem respeito e interesse e de o tema ser de incontestável actualidade.

Oraçäo 

"Dizes-me para carregar a minha cruz, Senhor. Não me dizes para ir à procura da minha cruz, com práticas ou penitências: encontro-a mesmo debaixo do nariz. Cada encontro difícil, que irrita o meu ego, faz parte do Teu plano para mim. Começando pelo meu corpo e pelo meu coração: as dores e limitações dos meus membros, a minha casmurrice e a minha timidez, fazem parte da minha cruz. Muitas vezes gostava de ser diferente, mas este(a) sou eu, e tenho que aprender a gostar de mim como Tu gostas. Quando não se me ocorre nada para dizer em grupo ou quando penso mal das coisas, estou a carregar a Tua cruz.
O que me consola é que Tu gostas da minha companhia. Não te importas com os meus silêncios e aceitas os meus resmungos de mau humor que, às vezes, é o mais parecido com uma conversa. Nem sempre me sinto bem comigo mesmo(a). Há momentos, como dizia Groucho Marx, em que não me apetecia pertencer a nenhum clube que me aceitasse como membro. Tu não só me aceitas, como me fazes sentir que pertenço aqui; como um recém-nascido que estás encantado de receber".
* * *
Texto roubado ao "Lugar Sagrado", que volto a aconselhar...

A arte da conservaçäo 

"Atendendo a que os Cardeais têm direito a voto num conclave até aos 80 anos, e que a esperança média de vida aumentou significativamente nas últimas décadas, é possível que a renúncia dos Bispos diocesanos passe para essa mesma idade".

Ou a implacável lógica "non sense" eclesiástica.

Bom dia 


"Cristo
tenía un espejo
en cada mano.
Multiplicaba
su propio espectro.
Proyectaba su corazón
en las miradas
negras.
¡Creo!"

Texto: Federico García Lorca
Imagem: Nick Tauro Jr

quarta-feira, março 22, 2006

Rir é o melhor remédio 

Quem frequenta a igreja habitualmente, já deve ter reparado que, à entrada, há quase sempre um painel onde se afixam cartazes, informaçöes e avisos. A lista que se segue é um conjunto desses "avisos à comunidade" que, por descuido ou por outra razäo qualquer, resultaram engraçados...
"
- Para quem tiver filhos e näo o saiba, temos um espaço preparado para as crianças.

- Recordai na vossa oraçäo todos aqueles que estäo cansados e desconfiam da nossa paróquia.

- O torneio de basquetebol das paróquias continua com o jogo de quarta-feira à tarde: Vinde animar-nos enquanto derrotamos Cristo-Rei!

- Por favor, colocai as vossas ofertas no envelope, junto aos defuntos que quereis recordar.

- O pároco acenderá a sua vela na que está sobre o altar. O diácono acenderá a sua na vela do pároco e, rodando, acenderá um a um todos os fiéis da primeira fila.

- Terça-feira à tarde haverá jantar no saläo paroquial à base de feijoada. Segue-se concerto.

- O custo da participaçäo na reuniäo sobre “Oraçäo e jejum” inclui as refeiçöes.

-O grupo de recuperaçäo da confiança em si mesmos reúne-se quinta-feira, pelas sete da tarde. Por favor, usem a porta das traseiras.

- Sexta-feira, às sete da tarde, as crianças do oratório representaräo “Hamlet”, de Shakespeare, no saläo da igreja. A comunidade está convidada a tomar parte nesta tragédia.

- Estimadas senhoras: näo esqueçais a venda de beneficiência! É uma boa maneira de se livrarem das coisas inúteis que estorvam em casa. Trazei os vossos maridos.

- O coro dos maiores de sessenta anos disolver-se-á durante todo o veräo, com o agradecimento de toda a paróquia.

- Quinta-feira, às cinco da tarde, haverá uma reuniäo do grupo de mäes. Pede-se a todas as senhoras que queiram formar parte do grupo das mäes que se dirijam ao pároco, no seu cartório.

- Tema da catequese de hoje: “Jesus caminha sobre as águas”. A catequese de amanhä: “À procura de Jesus”.
"
Esta lista foi recolhida em Espanha e circula por aqui na internet. Limitei-me a traduzi-la e decidi postá-la porque me fez rir um bom bocado. Sem maldade...

terça-feira, março 21, 2006

A Igreja e as conservas 

"Sei que há pessoas para quem não vale a pena gastar tempo com desafios perdidos à partida: a Igreja é, por natureza, conservadora, imobilista. Dizem que está blindada com dogmas, doutrinas, estruturas e costumes contra a mudança. Está sempre a repetir que tem de guardar o "depósito da fé", de manter a tradição e os rituais que a transmitem. Dá a imagem de uma indústria de conservas.
(...)Fala-se da democratização da Igreja. O prof. Ratzinger, enquanto jovem teólogo, não era nada alérgico à ideia. Depois, esqueceu-se. Não deve haver muita gente que gostasse de ver a Igreja transformada no que são hoje as democracias. Elas também precisam de uma profunda mudança para serem democráticas. A Igreja está mal quando é menos do que uma democracia. Tem de ser muito mais. Pertence-lhe, por natureza, ser um sinal e um instrumento de fraternidade no mundo".
* * *
Quem escreve assim é Frei Bento Domingues, na sua habitual coluna no jornal Público, do passado dia 19, e por mim discreta mas resolutamente surripiada daqui.
Entretanto, em Roma, parece que se quer mais latim. Näo consigo descortinar muito bem as razöes de tal ensejo, mas deve ter alguma coisa a ver com a indústria conserveira...

Modernices 

"As desculpas de falta de tempo para rezar estão a chegar ao fim com a era digital". Näo sei se será bem assim. Seja como for, parece curiosa esta iniciativa dos Jesuítas, a que deram o nome: "reza enquanto andas"...

Bom dia 

Ainda ontem pensava que não era
mais do que um fragmento trémulo sem ritmo
na esfera da vida.
Hoje sei que sou eu a esfera,
e a vida inteira em fragmentos rítmicos move-se em mim.
Eles dizem-me no seu despertar:
"Tu e o mundo em que vives não passais de um grão de areia
sobre a margem infinita
de um mar infinito.
"E no meu sonho eu respondo-lhes:
"Eu sou o mar infinito,
e todos os mundos não passam de grãos de areia
sobre a minha margem.
"Só uma vez fiquei mudo.
Foi quando um homem me perguntou:
"Quem és tu?"
Kahlil Gibran

segunda-feira, março 20, 2006

Até já! 

O decidiu pôr fim ao seu blog.
Teve as suas razöes.
Lamento o encerramento daquele outro Adro de vidas e histórias partilhadas.
Obrigado, Zé.

Quem me ajuda? 

Alguém me pode explicar que estranho fenómeno é este que me faz aparecer uns duplos sublinhados em algumas palavras dos textos, com links para a página da RX web search??? É boicote? Ataque de ET's? Vírus? Gripe das aves?

Esta noite... 

...o senhor Neves teve pesadelos.

Bioética 

O Jesuíta Juan Masiá, uma das autoridades mundiais em biogenética, foi expulso há tempos da cátedra que ocupava na Universidade Pontifícia de Comillas, em Madrid. As razöes foram as do costume: incomodou.
Ontem continuou a incomodar, numa entrevista ao El País, onde fala de bioética, de moral, de sexualidade e da sua actual visäo da Igreja. A ler.

Bom dia 



Experimento um grito
Contra o teu silêncio
Experimento um silêncio
Entro e saio
De mãos pálidas nos bolsos

Texto: Alexandre O'Neill
Foto: Rutherford-Bate

sábado, março 18, 2006

Geraçäo do "botellón" 

Aqui em Espanha, o "botellón" é uma instituiçäo juvenil quase täo arreigada como a "siesta" para as geraçöes seguintes.
A malta vai ao super-mercado, compra uns litros de cerveja, uns litros de vinho carrascäo de "bag on the box", umas garrafas de vodka e afins (os mais endinheirados...) e marcham para uma praça qualquer onde se juntam a outros e se embebedam em clima de grande fraternidade etílica.
A moda da convocatória por sms e por internet tem causado os maiores ajuntamentos alcoólicos de que há memória.
Ontem havia "botellón" marcado para cerca de vinte cidades espanholas. Uns tinham autorizaçäo das respectivas autoridades, outros näo.
Nesta cidade que me acolhe, o "botellón" estava marcado para a praça situada nas traseiras da minha casa e era um dos proibidos.
Montou-se o cerco policial com horas de antecedência, revistaram-se sacos e mochilas e impediu-se a desbunda.
Resultado: a malta dispersou, deu umas voltas e voltou a juntar-se, noutra praça, com aquele nervoso miudinho que as proibiçöes provocam. Distúrbios, barricadas, enfrentamentos com a polícia e algumas detençöes.
Hoje, os jornais falam da geraçäo do "botellón", como o Vicente Jorge Silva falava há uns anos, em Portugal, da "geraçäo rasca". Uns exagerados...
A mim, que já näo tenho idade para a "fiesta callejera" a proibiçäo deu-me jeito. Assim consegui dormir...

Interlúdio de pessimismo cívico 

Fala-se muito de cidadania. É bonito. Poético, até. Mas todos sabemos que os cidadãos não existem. Há contribuintes, espectadores e consumidores. Que cumprem os seus deveres cívicos quando pagam os impostos, vêem os anúncios e consomem. Fatalidade? Não! Anestesia.

Bom fim de semana 

«Nós temos cinco sentidos:
são dois pares e meio de asas.
- Como quereis o equilíbrio?»
David Mouräo Ferreira

sexta-feira, março 17, 2006

Dramas urbanos 

Muitos padres de paróquias urbanas queixam-se da mobilidade dos membros das suas comunidades. Dizem eles que é cada vez mais difícil congregar uma comunidade estável e comprometida. Claro. Não há prior que resista à cultura do zapping.

Igreja da Encarnaçäo 

A relação entre a Igreja e o mundo não se pode conceber senão à luz da realidade da Encarnação. O cristianismo é a religião da Encarnação, o que implica a presença na história, na sua totalidade. Em virtude deste princípio fundamental, a atitude da Igreja há-de ser a da "encarnação" em todas as épocas da história ainda que, em virtude da sua própria natureza escatológica, não se identifique nem pertença, de forma exclusiva, a nenhum tempo, espaço ou circunstância.
Desta forma, "as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração", como nos dizia a Gaudium et Spes. E esta é a melhor definição de compromisso cristäo que encontrei até hoje num documento da Igreja.
Isto significa que devemos fazer dos problemas do mundo dos homens os nossos verdadeiros problemas eclesiais. E digo eclesiais e não eclesiásticos. Temos de ter claro para nós que os problemas eclesiásticos são de segunda ordem dentro do eclesial. Infelizmente, perdemos demasiado tempo com a dimensão eclesiástica da Igreja. A principal reforma que a Igreja tem de fazer é a sua conversão ao Reino de Deus, o colocar-se, de facto, ao serviço da Causa de Jesus, em nome de uma nova humanidade marcada pelas relações correctas de justiça, de amor, de paz e de libertação. Ou somos voz e âmbito de liberdade e de libertação ou não somos nada.


Bom dia 



"E näo te esqueças, meu coraçäo,

que as coisas humanas apenas

mudanças incertas säo"

Arquílogo, séc. VIII AC


Aprofundamento 

Sobre os leigos e a sua presença numa Igreja entendida como comunhäo, coloquei um texto na Terra da Alegria. É uma síntese da doutrina católica sobre o tema. A quem interessar...

quinta-feira, março 16, 2006

A evoluçäo existe... 

"A Igreja é, por essência, uma sociedade desigual, ou seja, que compreende duas categorias de pessoas: os pastores e o rebanho; os que ocupam um posto nos diferentes graus da hierarquia e a multidão dos fiéis. E estas categorias são de tal modo distintas uma da outra que só no corpo pastoral (ou seja, a hierarquia) reside o direito e a autoridade necessárias à promoção e direcção de todos os membros para o fim da sociedade. Quanto à multidão, não tem outro direito senão o de se deixar conduzir e, qual rebanho manso, seguir os seus pastores". ( Pio X, Vehementer, 1906).
* * *
Há precisamente um século, era este o entendimento do magistério sobre os leigos. Diante disto... é inegável que evoluímos!

Bom dia! 



Se as coisas são inatingíveis... ora!

não é motivo para não querê-las.
Que tristes os caminhos, se não fora
a mágica presença das estrelas!



Texto: Mário Quintana
Imagem: Spiral galaxy M101 in Ursa Major,
vista pelo telescópio 8" f/10 Schmidt Cassegrain @ f/6.3,
na Califórnia.

quarta-feira, março 15, 2006

Coisas da vida 

Alguns dos meus melhores amigos säo ateus, graças a Deus. E, às vezes, aprendo deles grandes liçöes de fé.

Bom dia 


"Caminho eternamente sobre estas margens,
entre a areia e a espuma.
O fluxo do mar apagará a impressão dos meus passos,
e o vento levará a espuma.
Mas o mar e a margem permanecerão
eternamente".
Texto: Kahlil Gibran
Foto: Mark Howell

segunda-feira, março 13, 2006

A crise! 

"O Anuário Estatístico da Igreja revela menos 10 mil baptismos desde 2000 e mostra a existência de muito menos ordenações, com a média de uma para cada dois padres que morrem"
"Atingimos os níveis mais baixos desde os anos 70. Há uma crise sobre o ministério da Igreja e sobre a forma como as comunidades cristãs podem ser animadas", lamenta [D. Carlos Azevedo, secretário da C.E.P.]. A crise estende-se à vocação sacerdotal. De 2000 a 2003, o número de sacerdotes baixou de 3159 para 3029 menos 130. A estatística revela que por cada dois padres que morrem, apenas um é ordenado. Em 2003, por exemplo, morreram 80 padres e foram ordenados 37. Os seminaristas de filosofia e teologia também são menos."
"O anuário revela, ainda, e contudo, que 91,52% da população portuguesa diz professar a fé católica. Relativamente a isto, D. Carlos é peremptório "são muito católicos, mas pouco cristãos". "Ser católico não é só ser baptizado ou ir à missa. É uma exigência de vida, é seguir os evangelhos, é ser generoso. É ter consciência de que o que é pedido nem sempre é natural, ou seja, que exige conversão".
Sobre o futuro, tem uma perspectiva optimista "A Igreja talvez tenha menos gente, mas mais consciente", remata."
.
Informaçäo do Jornal de Notícias, surripiada a um colega...
.
O discurso da crise näo é novo. E há muitos anos que os números säo implacáveis. E indesmentíveis.
Nas reuniöes de padres e em círculos eclesiais de pessoas mais ou menos responsáveis, as análises sucedem-se e é já muito antigo o discurso consequente: é preciso renovar a Igreja, mudar o discurso, adaptar a acçäo pastoral às novas realidades, etc...
Apesar do diagnóstico feito, da análise realista e das hipóteses surgidas, näo conheço nenhuma reforma que se veja. E näo se prevê para breve. E as razöes säo muito simples: é que para afrontar com realismo e eficácia a "crise que toda a gente vê e comenta", teria de se começar por uma profunda reforma da organizaçäo eclesiástica. Está bem, está...
Diz D. Carlos Azevedo que "A Igreja talvez tenha menos gente, mas mais consciente". Embora pedindo desculpa a D. Carlos, por quem tenho admiraçäo e respeito, tenho de dizer que esta frase, mil vezes repetida por muita gente, me soa sempre a fantasia de quem näo quer olhar para as coisas com olhos de ver.
A igreja tem menos gente. Parágrafo.
Isto é grave? Näo forçosamente. Tem, até, aspectos positivos. Mas isto significa que os que ficam säo mais conscientes? Näo. Pode até significar uma perigosa deriva em direcçäo ao fundamentalismo. Que já se nota, e bem, em certos meios. E contra o qual também näo vejo nenhuma "medida".
Que säo precisos cristäos melhor formados e mais conscientes? Pois. Mas isso é uma necessidade de sempre.
Parece-me que as mudanças, a acontecerem, teräo de vir por reacçäo à inevitabilidade. Daqui por 20 ou 30 anos, quando os padres estiverem reduzidos a um terço ou a um quarto e a estrutura eclesiástica entrar em colapso, pode ser...
E pode ser que, entäo, chegue mesmo a "hora dos leigos"!

Comunicar 

Temos cada vez mais formas de nos comunicarmos. Nunca o ser humano teve esta possibilidade. A qualquer hora, em qualquer sítio, podemos comunicar com quem quisermos. Pode é haver pouco para dizer.

Bom dia 

Decir el pan, la lucha, el gozo, el llanto,
el monótono sol, la noche ciega.
Verter la vida en libación de canto,
vino en la paz y sangre en la refriega.

Desnuda al viento mi palabra os llega.
Sobre la plaza de la fiesta canto.
Pido que todos entren en la siega.
Vengo a espantar las fieras del espanto.

Mediterráneamente luminosa
escancio en mi palabra cada cosa,
vaso de luz y agua de verdad.

Si el Verbo se hace carne verdadera,
no creo en la palabra que adultera.
Yo hago profesión de claridad.
Soneto: D. Pedro Casaldáliga
Foto: Jerry Olson

sábado, março 11, 2006

Cinismo 

O cepticismo está fora de moda. O que está a dar é o cinismo. A velha e demodée atitude céptica de duvidar e questionar ideias e crenças deu lugar a um cinismo radical.
Qual é a diferença? Simples. Por exemplo: o céptico questiona a política dos governos e duvida das reais intenções das Organizações Não Governamentais; o cínico não só faz isto, como acha que os mendigos são uns aldrabões.
Para um cínico não existe acção desligada de egoísmo. O cínico não acredita em actos desinteressados. Não espera nada de ninguém e, portanto, também não se sente obrigado em relação a ninguém.

Bom fim de semana 

Espero sempre por ti o dia inteiro,
Quando na praia sobe, de cinza e oiro,
O nevoeiro
E há em todas as coisas o agoiro
De uma fantástica vinda.
Texto Sophia M. Breyner
Foto:Anna Pagnacco

sexta-feira, março 10, 2006

Infodependência 

Acumulamos informação sem necessidade aparente. Necessitamos estar "conectados" à realidade: compramos jornais, vemos televisão, ouvimos rádio, usamos a internet e precisamos sentir que sabemos o que se passa no mundo embora, frequentemente, nos escape o que se passa na nossa casa e na nossa vida.
Somos infodependentes. Mas poucas vezes bem informados.

Sobre o conhecimento 

A evolução do conhecimento também se avalia pela forma em que se fixa e como se busca. Antes tinhamos as enciclopédias, nascidas da pretensão de compendiar e sistematizar todo o conhecimento. Agora temos a internet que, sem pretensão nenhuma, nos oferece de bandeja o caos do conhecimento pulverizado.

Bom dia 

Mal nos conhecemos
Inauguramos a palavra amigo!
Amigo é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece.
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão! Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
Amigo é o contrário de inimigo!
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado.
É a verdade partilhada, praticada.
Amigo é a solidão derrotada!
Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!

Poema: Alexandre O'Neill
Foto: Jeff T. Alu

quinta-feira, março 09, 2006

Êxito 

O êxito de uma vida mede-se, nos dias que correm, pelo seu grau de saturação, pelo nível de sobreexcitação a que se submete o sujeito. A vida ideal é a que é vivida sem pausas nem silêncios. Horror vacui. Mas mais vazios que nunca!

Evoluçäo das espécies 

Simplifiquemos, para ver se nos entendemos.
A Terra tem cerca de 4 500 milhões de anos. O nosso avô Homo Sapiens Sapiens não tem mais de 90 000 anos. Um jovem, portanto.
Agora condensemos a idade da Terra num só ano. O homem moderno teria surgido às 23.50 horas do dia 31 de Dezembro, a tempo apenas de comer as passas e brindar com champanhe. Como foi possível fazer tanta asneira em dez minutos???

Bom dia 

É urgente o Amor,
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros,
e a luz impura até doer.
É urgente o amor,
É urgente permanecer.

Texto: Eugénio de Andrade
Foto: Jerry Olson

quarta-feira, março 08, 2006

Dispersão da angústia 

Vivemos tempos paradoxais. Existimos e sobrevivemos na permanente tensão entre o excesso de tédio, próprio dos povos de barriga cheia, e a falta de sossego das nossas depressões e psicoses. São dias de dispersão da angústia. Já nem sabemos de que padecemos. Devemos ter perdido alguma coisa pelo caminho... O Ocidente já não se cura com Prozac.

A todas as mulheres 

Mulher-Poesia
que deixa no meu corpo bocados
de poema

Mulher-Criança
que desce à minha infância
e me traz adulta

Mulher-Inteira
repartida no meu ser

Mulher-Absoluta
Fonte da minha origem
Manuela Amaral

terça-feira, março 07, 2006

O tempo do corpo 

Uma das características definitórias da cultura contemporânea é a ideia de ter superado o antropocentrismo renascentista ou moderno, para passarmos ao que Miguel Ibañez chama somatocentrismo pós-moderno. O corpo é a estrela de uma sociedade ultraviolenta, supertecnificada e hipersexual. Esta explosão de corporeidade pode envernizar-se e aparecer requintada e complexa. Mas disfarça mal a animalidade a que nos reduz.

Sinais do Apocalipse: 

Paulo Portas chega hoje à televisäo, como comentador!

Ainda os leigos... 

...e diferentes formas de perceber o que é a Igreja. Merece leitura.

Bom dia 



Se tanto me dói que as coisas passem

É porque cada instante em mim foi vivo

Na busca de um bem definitivo

Em que as coisas de Amor se eternizassem

Sophia de Mello Breyner Andresen

Imagem de Lynne Taetzsch


segunda-feira, março 06, 2006

Catequeses Quaresmais 

Nem tudo o que é legal é moral. Esta é uma tendência facilitante, a de considerar que o que é legal é moral. E pode haver leis civis, que se os cristãos as aplicarem a si mesmos, pecam, ofendendo gravemente a Deus. Em certas circunstâncias devem mesmo recusar-se, através do estatuto de ‘objectores de consciência’, a participar na sua aplicação". Catequese integral, aqui.

Bom dia 

"Deus é mais belo que eu.
E não é jovem.
Isto sim, é consolo".

Adélia Prado
(Descoberta graças à MC)

sábado, março 04, 2006

Dúvida 

Lá fora há chuva, vento e frio.
Näo sei se me zangue, se me deite...

Sobre o moralismo 

«Uma das deformações mais perigosas da religião é o moralismo», porque reduz a fé a «portar-se bem» e a «cumprir» determinadas normas. «Tudo resulta muito correcto e formal». «Costuma ter também um aliado implacável: o sentimento de culpa. Deve-se portar bem, e tem de fazê-lo, para não se sentir mal. Agreguemos também que existem moralismos com culpa de vários tipos: de direita e de esquerda, horizontais e verticais».

Boa pergunta! 

Segundo Bento XVI, "...é justo perguntar-se se, no serviço ministerial, apesar do facto de o Sacramento e o carisma serem o único binário em que se realiza a Igreja, não se poderá oferecer mais espaço, mais posições de responsabilidade às mulheres”.

Livro de Horas 

Aqui, diante de mim,
Eu, pecador, me confesso
De ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
Que vão em leme da nau
Nesta deriva em que vou.

Me confesso
Possesso
Das virtudes teologais,
Que são três,
E dos pecados mortais
Que são sete,
Quando a terra não repete
Que são mais.

Me confesso
O dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas
E das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo
Andanças
Do mesmo todo.

Me confesso de ser charco
E luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco
Que atira setas acima
E abaixo da minha altura.

Me confesso de ser tudo
Que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão
Desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.

Me confesso de ser Homem.
De ser o anjo caído
Do tal céu que Deus governa;
De ser o monstro saído
Do buraco mais fundo da caverna.

Me confesso de ser eu.
Eu, tal e qual como vim
Para dizer que sou eu
Aqui, diante de mim!

Miguel Torga

sexta-feira, março 03, 2006

Bom dia 

Quando a ternura
parece já do ofício fatigada,
E o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
Quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas

Eugénio de Andrade

quinta-feira, março 02, 2006

Travessia... 

De pouco servem quarenta dia de jejum e penitência se os nossos olhos näo se fixarem, sorrindo, na ressurreiçäo que adivinhamos.
Mas um pouco de deserto faz-nos bem. Centra-nos e desperta-nos. E, sobretudo, faz-nos sonhar com a Terra Prometida. Sonhá-la já é alcançá-la, de certa maneira.

Marcinkus 

O Arcebispo Paul Marcinkus morreu há poucos dias, com 84 anos. Nos últimos tempos, pouco ou nada se ouvia falar dele. Mas quem se lembra do colapso do Banco Ambrosiano e de toda a novela conspirativa que floresceu à volta do tema, também recorda a enigmática figura do Arcebispo americano. Um interessante artigo, publicado no The Tablet, ajuda a contextualizar a vida e acçäo do "banqueiro do Vaticano".

Era bom que houvesse mais 

O Cardeal Roger Mahony, Arcebispo de Los Angeles, decidiu enfrentar Bush e continuar a prestar ajuda aos imigrantes ilegais, contrariando a nova e xenófoba legislaçäo americana, que pretende castigar quem ajude imigrantes clandestinos. Um gesto cristäo que merece aplauso!

Menos um título 

O Papa Bento XVI renunciou ao título de Patriarca do Ocidente. Parece-me bem. Até porque o Ocidente há muito tempo que renunciou ao Patriarca... Ainda sobram títulos como "Sumo Pontífice" ou "Soberano do Estado do Vaticano". Ao representante de Cristo pede-se a simplicidade do Mestre.
Näo passa despercebida a importância simbólica desta renúncia no campo do ecumenismo, sobretudo na relaçäo com as Igrejas orientais. Bom sinal.

Attcchhiiiimmmm!!!! 

Estou com gripe. Nada de grave. Mas basta isto para o corpo se arrastar como se a vida fosse um sacrifício. Que mal preparado estou para tolerar o sofrimento!!!

Bom dia 


Há pensamentos que são orações.
Há momentos nos quais,
seja qual for a posição do corpo,
a alma está de joelhos

Victor Hugo

quarta-feira, março 01, 2006

Do Carnaval às Cinzas 

Sobre a origem da palavra Carnaval não há unanimidade entre os estudiosos, mas as hipóteses “carne vale” (adeus carne!) ou de “carne levamen” (supressão da carne) levam-nos, indubitavelmente, para o início do período da Quaresma. A própria designação de Entrudo, ainda muito utilizada entre nós, vem do latim “introitus” e apresenta o significado de dar entrada, começo, em relação a esse tempo litúrgico.O carnaval é uma festividade popular colectiva, cíclica e agrária. Teve como verdadeiros iniciadores os povos que habitavam as margens do rio Nilo, no ano 4000 a.C., e uma segunda origem, por assim dizer, nas festas pagãs greco-romanas que celebravam as colheitas, entre o séc. VII a.C. e VI d.C.
A Igreja viria a alterar e adaptar práticas pré-cristãs, relacionando o período carnavalesco com a Quaresma. Uma prática penitencial preparatória à Páscoa, com jejum começou a definir-se a partir de meados do século II; por volta do século IV, o período quaresmal caracterizava-se como tempo de penitência e renovação interior para toda a Igreja, inclusive por meio do jejum e da abstinênciaOlhando para o calendário, rapidamente se percebe que é a Páscoa quem rege o Carnaval: a Páscoa é celebrada no primeiro Domingo da lua cheia após o equinócio da primavera, no hemisfério Norte. O Carnaval acontece entre 3 de Fevereiro e 9 de Março, sempre quarenta e sete dias antes da Páscoa, ou seja, após o sétimo Domingo que antecede o Domingo de Páscoa.
Tertuliano, São Cipriano, São Clemente de Alexandria e o Papa Inocêncio II foram grandes inimigos do carnaval, mas, no ano 590, a Igreja Católica permite que se realizem os festejos do Carnaval, que consistiam em desfiles e espectáculos de carácter cómico.
No séc. XV, o Papa Paulo II contribuiu para a evolução do Carnaval, imprimindo uma mudança estética ao introduzir o baile de máscaras, quando permitiu que, em frente ao seu palácio, se realizasse o Carnaval romano, com corridas de cavalos, carros alegóricos, corridas de corcundas, lançamento de ovos, água e farinha e outras manifestações populares.
No dia seguinte, a cinza recorda o que fica da queima ou da corrupção das coisas e das pessoas. Este rito é um dos mais representativos dos sinais e gestos simbólicos do caminho quaresmal.
Nos primeiros séculos, apenas cumprem este rito da imposição da cinza os grupos de penitentes ou pecadores que querem receber a reconciliação no final da Quaresma, na Quinta-feira Santa, às portas da Páscoa. Vestem hábito penitencial, impõem cinza na sua própria cabeça, e desta forma apresentam-se diante da comunidade, expressando a sua vontade de conversão.
A partir do século XI, quando desaparece o grupo de penitentes como instituição, o Papa Urbano II estendeu este rito a todos os cristãos no princípio da Quaresma. As cinzas, símbolo da morte e do nada da criatura em relação a seu Criador, obtêm-se por meio da queima dos ramos de palmeiras e de oliveiras abençoados no ano anterior, na celebração do Domingo de Ramos.
Uma prática penitencial preparatória à páscoa com jejum começou a afirmar-se a partir de meados do século II; outras referências a um tempo pré-pascal aparecem no Oriente, no início do século IV, e no Ocidente no final do mesmo século.
Fonte: Ecclesia

Bom dia 

Morre-se de medo
Morre-se de tédio
Mas do que se morre mais
É da falta de amor
Mal sem remédio que nos faz desiguais
Já morremos mil vezes
Já morremos de mil mortes
Porém todas naturais
Mas sempre renascemos para amar um pouco mais
Até que um dia a solidão
Daninha-mãe das decisões finais
Nos proíba o coração de bater mais.

Torquato da Luz

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